quarta-feira, 3 de junho de 2015

Nota de aula: julgamento conforme o estado do processo




JULGAMENTO CONFORME O ESTADO DO PROCESSO.

Após o prazo para a resposta do réu, o processo é remetido ao juiz e dá-se início a uma nova fase do processo, chamada de fase de saneamento ou ordenamento do processo. Nesta fase, o juiz tomará, se for o caso, uma série de providências com o propósito de proferir uma decisão. As providências preliminares preparam o processo para uma decisão. Nesta fase, o juiz deixará o processo pronto, saneado, para que nele seja proferida uma decisão. Para que isso aconteça, ele toma algumas providências e, por isso, são chamadas de providências preliminares.

Na fase de saneamento há uma concentração dos atos de saneamento. É um momento dedicado apenas para isso, mas não quer dizer que só haja atos de saneamento nesse momento. Por exemplo: quando o juiz recebe a petição inicial, o juiz pode determinar seja o autor intimado a emendá-la. É um ato de sanemanento no início do processo. Existem atos de saneamento praticados no curso do processo.

O número de providências preliminares possíveis para o juiz tomar nessa fase é infinito. Variarão conforme a resposta do réu. Exemplo: o réu ofereceu denunciação da lide. A providência preliminar do juiz poderá ser a citação do denunciado. Exemplo: o réu oferece resposta com uma defesa indireta. A providência preliminar a ser adotada pelo juiz é intimar o autor para oferecimento de réplica. Exemplo: o réu foi citado por edital e ficou revel. Qual a providência preliminar? Nomear curador especial (art. 9º, II, CPC/1973, art. 72 do novo CPC). Exemplo: o réu aponta um defeito na petição inicial. A providência preliminar é intimar o autor a consertar o defeito, assinalando prazo para tanto, sob pena de extinção do feito sem julgamento de mérito.

Porém, há uma providência preliminar que é tão especial que é digna de um tratamento separado. Chama-se ação declaratória incidental.

Em toda decisão, temos uma questão principal e questões incidentes. A questão principal é o objeto da decisão, aquela que será resolvida no dispositivo da decisão (parte final). As questões incidentes são os pressupostos da decisão e serão resolvidas na fundamentação da decisão.

Um exemplo para deixar o tema mais didático. Questão principal: caso ou não caso? Questões incidentes: gosto ou não gosto da pessoa? Quero ou não quero tolher a minha liberdade? Estou a fim de acordar todo dia com aquela pessoa ao meu lado?

Em um processo, a questão principal é saber se será acolhido ou não o pedido formulado. As questões incidentes serão todas as questões que o juiz terá que examinar para saber se deve ou não acolher o pedido formulado. Essas observações são importantes, pois se a questão resolvida é uma questão incidente, não será abrangida pelos efeitos da coisa julgada.

A expressão “o juiz examinou a questão incidenter tantum, bastante utilizada na praxe forense, significa examinar a questão como uma questão incidente. Se o juiz analisou a questão como principal, a expressão latina é principaliter tantum (estranhamente, essa expressão não é tão usada na praxe forense e, por isso mesmo, tem maior probabilidade de ser cobrada em exames de ordem e concursos públicos).

Uma mesma questão pode ser incidente em um processo e principal em outro. Não existem questões que sejam só principais ou só incidentais. A questão será incidental ou principal a depender do modo como entrou no processo. Exemplo: inconstitucionalidade de uma lei. Normalmente, é uma questão incidente, posta como um fundamento para a procedência ou improcedência do pedido, mas em ações do controle abstrato de constitucionalidade (ADI, ADC e ADPF) saber se a lei é constitucional ou não é a questão principal. Outro exemplo: a filiação. Em uma ação de alimentos, a filiação é uma questão incidente, um fundamento para a procedência ou improcedência do pedido. Mas, em uma ação de investigação de paternidade, é considerada a questão principal.


Em um processo, ou a questão é principal ou é incidente. Não há uma terceira categoria.

A doutrina alude ainda a questão prévia, que é uma questão que tem de ser resolvida antes de outra. Alguns autores usam como sinônimo questão subordinante. Ela subordina a solução da questão seguinte. Por exemplo: quero casar. A questão prévia: eu já sou casado? Pois se eu já sou casado, não posso casar novamente antes de me divorciar.

As questões prévias se dividem em questão preliminar e questão prejudicial. A questão preliminar é questão cuja solução pode impedir o exame da questão seguinte. Ela é uma espécie de obstáculo. O juiz deve enfrentá-la e, a depender do modo como ele a resolver, a questão seguinte nem examinada será. A doutrina usa como metáfora o sinal de trânsito (semáforo). A preliminar é como se fosse o semáforo: se der vermelho, você nem vai adiante, você não resolve a questão seguinte. Apenas se der verde, você irá adiante. Um exemplo é a alegação de incompetência do juízo. Se o juiz for incompetente, ele não examina o pedido.

A questão prejudicial é a questão prévia cuja solução pode definir o modo como você resolverá a questão seguinte. A resolução da questão prejudicial não tem o condão de impedir o exame da questão seguinte, apenas influencia o modo como ela será examinada. É como se questão prejudicial fosse uma placa de bifurcação, indicando dois ou mais caminhos possíveis. Exemplo: a filiação em relação ao direito à alimentos. Se não for filho, examina-se a questão seguinte para concluir que não há direito à alimentos.

Cuidado: é errado pensar que toda questão prejudicial é de mérito e toda questão preliminar é processual. Não existe essa relação.

A prescrição é uma questão de mérito mas, em relação as demais defesas oferecidas, é uma questão preliminar. Pois, se o juiz acolher a prescrição, não analisará as demais teses defensivas. Agora, em relação ao pedido, a prescrição é uma questão prejudicial, pois influenciará o modo da resolução da questão principal, sem contudo impedir o seu exame.

Uma questão prejudicial pode ser incidental ou principal. Há duas formas de uma questão prejudicial tornar-se principal. Ou isso é feito desde o início do processo, ou seja, já na petição inicial, o autor coloca a questão prejudicial como questão principal (Exemplo: ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos). Mas também é possível a questão prejudicial tornar-se principal ulteriormente, através da ação declaratória incidental (art. 325 e 470 do CPC/1973). É essa a sua finalidade: pedir a transformação da análise de uma questão prejudicial, que inicialmente seria analisada incidenter tantum, em questão principal, para que sua resolução seja abrangida pelos efeitos da coisa julgada.



Para que caiba ação declaratória incidental, é necessário um pressuposto: o réu tem de ter controvertido a questão prejudicial. O réu contestou e, na contestação, deve negar a questão prejudicial (ex: não sou pai). Se há negativa da prejudicial, o juiz, diante dessa negativa, intima o autor, que poderá, em 10 dias, pedir a declaração incidental. Se o autor fizer isso, estará agregando um novo pedido ao processo.

O Código de Processo Civil só fala em relação ao autor, mas o réu também pode propor ação declaratória incidental, segundo doutrina e jurisprudência dominantes, na forma de reconvenção.

O art. 469, III, do CPC fala que não faz coisa julgada a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentemente no processo. Mas o art. 470 diz que faz, todavia, coisa julgada a resolução da questão prejudicial se a parte o requerer. Como a parte pode requerer? Ou no início do processo ou através da declaratória incidental.

No novo CPC o regramento é diferente, previsto no art. 503, § 1º tornando desnecessária a ação declaratória incidental para que a questão prejudicial fique abarcada pelos efeitos da coisa julgada, desde que presentes certos requisitos elencados no dispositivo: 

"Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.
§ 1o O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se:
I - dessa resolução depender o julgamento do mérito;
II - a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;
III - o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.
§ 2o A hipótese do § 1o não se aplica se no processo houver restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial."

Após as providências preliminares, o juiz profere uma decisão denominada julgamento conforme o estado do processo. É uma designação genérica. Qualquer decisão que o juiz tomar após as providências preliminares será chamada assim. Existem 7 variações do julgamento conforme o estado do processo:

A escolha de uma dessas 7 formas variará de acordo com as providências preliminares. Vamos examiná-las:

1ª – O juiz pode extinguir o processo em razão da prescrição ou decadência. Trata-se de extinção do processo com resolução do mérito (art. 269, IV, do CPC/1973, 487, II, novo CPC);

2ª – A extinção do processo sem resolução do mérito (art. 267 do CPC, art. 485 do novo CPC). A doutrina tradicional denomina essa hipótese de decisão terminativa. Outros autores chamam de manifestação de crise do processo. Livros mais antigos ainda chamam de crise de instância. O art. 267 do CPC tem 10 incisos que devem ser examinados dividindo-os em grupos:

* Revogação: incisos II (processo parado há mais de 1 ano por inércia da parte), III (não cumprimento de diligências ou abandono do processo por mais de 30 dias) e VIII (quando o autor desistir da ação). Desistir do processo não é renunciar ao direito. A desistência é da apreciação do pedido. A desistência exige poder especial para o advogado.

O processo parado há mais de 1 ano por inércia das partes (art. 267, II, CPC/1973 e 485, II, novo CPC). Normalmente, o processo fica parado por negligência do juízo, não das partes. Antes de extinguir o processo por abandono, o juiz tem de intimar ambas as partes pessoalmente para em 48 horas tomarem uma providência.

O não cumprimento de diligências ou abandono do processo por mais de 30 dias, pelo autor (art. 267, III, CPC, art. 485, III, novo CPC ): já essa hipótese é muito comum. Também aqui deve ser feita a intimação pessoal prévia ao autor para tomar a providência. Esta hipótese que, causando a extinção do feito por 3 vezes, poderá gerar a perempção. Se o réu já apresentou resposta, a extinção por abandono depende de provocação do réu (pois não fosse exigível, o autor poderia burlar a necessidade de consentimento do réu para a desistência da ação abandonando o processo. Súmula n. 240 do STJ). A extinção em razão do abandono só poderá ocorrer quando o ato não praticado pelo autor for indispensável ao prosseguimento do processo. Exemplo: o autor deixa de pagar o perito. Não é caso de extinção do processo, mas apenas de não fazer a perícia. Exemplo: não indicou endereço do réu, não pagou custas. O abandono em ações coletivas também gera a sucessão processual.

A desistência (art. 267, VIII, CPC, art. 485, VIII, novo CPC) precisa ser homologada pelo juiz para produzir efeitos (art. 158, parágrafo único, CPC/1973 e art. 200, parágrafo único, novo CPC). Só pode ser apresentada até a apresentação da sentença, mas em MS o STF decidiu que pode haver desistência mesmo após a sentença favorável. Não confundir com a desistência do recurso, que obviamente só pode ocorrer depois da sentença. Se o réu apresentou resposta, a desistência depende da sua concordância, mas a discordância deve ser fundamentada, sob pena de ser abusiva, segundo o STJ. A desistência pode ser parcial. Não se admite desistência em ADI. Nas ações coletivas, a desistência gera uma sucessão processual e não a extinção do processo, salvo-se houver fundadas razões para a desistência, em razão da primazia do julgamento do mérito do processo coletivo. A Fazenda Pública somente pode concordar com a desistência do autor se o autor renunciar ao direito a que se funda a ação (art. 3º da Lei n. 9.469/97). Cuidado: desistência não se pede, se comunica. É tecnicamente errado requerer a desistência. O que se pede é a homologação da desistência para a produção de seus efeitos. Tudo isso aplica-se a desistência de pedido contraposto e também à da reconvenção;

* Invalidade ou inadmissibilidade: incisos I (indeferimento da inicial), IV (falta de pressuposto processual), V (coisa julgada, litispendência ou perempção), VI (carência de ação) e VII (convenção de arbitragem): o processo tem um defeito que compromete a sua validade. Não sendo corrigido o defeito, o processo foi extinto sem exame do mérito.

Cuidado: diz o art. 268 do CPC/1973 que a extinção do processo sem exame do mérito não impede a repropositura da ação, salvo o inciso V (coisa julgada, litispendência ou perempção). A tese de que a extinção do processo sem resolução de mérito autoriza a propositura da mesma ação tem exceção expressa na lei. Além disso, o STJ disse que a referência ao inciso V é exemplificativa, ou seja, a menção ao inciso V não esgota os casos em que não se permite a repropositura da ação e, para exemplificar, cita o inciso IX, pois trata-se de extinção do processo sem resolução de mérito onde não será possível a repropositura. As outras hipóteses de invalidade impedem a repropositura da ação. Se o juiz reconheceu um defeito, não é possível propor a a exata ação, sob pena de incorrer no mesmo defeito. Imagine a extinção por ilegitimidade passiva. É possível propor a ação novamente contra a mesma pessoa? Não. Para o STJ, todos os casos de extinção por invalidade, não se pode voltar a juízo da mesma maneira. É preciso corrigir o defeito e voltar a juízo, o que implicará em nova ação e não a mesma anterior. Por causa dessa situação peculiar, alguns autores defendem que a ação rescisória nessas hipóteses de extinção do processo sem resolução do mérito, pois são hipóteses de extinção do processo sem resolução do mérito que impedem a repropositura da ação. Tudo isso se aplica na interpretação dos arts. 485. 486 e 487 do novo CPC:

* Morte da parte e o direito for intransmissível: inciso IX do art. 267 (se o direito discutido for intransmissível. Ex: candidato discutindo direito de nomeação em cargo público) e art. 485, IX, do novo CPC;

* Confusão: inciso X do art. 267 do CPC/1973: Há confusão quando as situações quando as situações de credor e devedor se reúnem em uma mesma pessoa. Quando isso acontece, quando alguém é credor de si mesmo, a obrigação se extingue (art. 381 do Código Civil). O pagamento, compensação, transação e a remição também são formas de extinção da obrigação. Se o juiz reconhece o pagamento ou compensação e extingue o processo, o faz com exame do mérito (art. 269). A confusão, então, importa em extinção do processo sem exame do mérito? É um paradoxo. A doutrina, acertadamente, entende que a confusão está mal posta, aparecendo como extinção sem exame do mérito quando na verdade não se enquadra nessa hipótese e sim na extinção com exame do mérito. No novo CPC a hipótese encaixa-se no inciso X do art. 485: demais casos previstos em lei.


3ª - Extinção do processo em razão da autocomposição. Aqui o processo é extinto com exame do mérito. Existem três hipóteses: o reconhecimento da procedência do pedido (art. 269, II, CPC/1973), a transação (art. 269, III, CPC/1973) e a renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação (art. 269, V, CPC/1973). Estamos aí diante de sentenças que homologam negócio jurídico, compondo o conflito. O juiz, aqui, não julga a causa, apenas homologa a solução que as partes acordaram para a causa. O advogado precisa de poderes especiais para essas hipóteses. A autocomposição pode ser parcial. Pode se dar a qualquer momento, mesmo depois da coisa julgada material. Mas é preciso que o direito em jogo permita a autocomposição. Cuidado: há direitos que são irrenunciáveis, mas permitem autocomposição (exemplo: alimentos são irrenunciáveis, mas admite-se a transação quanto ao valor, atrasados). A autocomposição produz efeitos imediatamente entre as partes, sendo que a homologação é necessária apenas para extinção do processo. O acordo já vale entre as partes antes mesmo da assinatura do juízo, salvo se no próprio acordo tiver a cláusula de que só valerá a partir da homologação judicial. As partes podem inserir, na autocomposição, cláusulas que digam respeito a outras lides, inclusive lides que fogem a competência do juízo. É possível, na autocomposição relativa a um crédito discutido judicialmente, a inclusão de outro crédito que não era objeto da demanda.

4ª – O juiz profere o julgamento antecipado da lide (art. 330 do CPC/1973 e art. 355 do novo CPC). O juiz chega a conclusão, neste momento, de que pode julgar a causa apenas com a prova documental produzida. É o julgamento da lide sem necessidade de produção de prova em audiência. A petição inicial veio com documentos. A contestação também. O juiz, ao analisar os documentos, entende que não precisa de mais nada para julgar a causa. É sempre com base em prova documental. Notem que se trata de um mecanismo que abrevia o processo. É preciso cuidado para que não ocasione cerceamento de defesa. O juiz só deve julgar antecipadamente a lide quando a causa realmente não demandar a produção de prova em audiência. Nada impede que ele julgue improcedente, mas ele não poderá julgar antecipadamente a lide decidindo improcedente o pedido com fundamento da ausência de provas, pois isso importa em cerceamento de defesa. No novo CPCArt. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349.

Quando as questões de fatos puderem ser comprovadas apenas por prova documental (art. 330, I, CPC, art. 355, I, novo CPC). O dispositivo do CPC/1973 é escrito de uma forma diferente, bem tosca, mas é isso que ele quer dizer.

Quando ocorrer a revelia (art. 330, II, CPC/1973, 355, II, novo CPC): na verdade, não é quando ocorrer a revelia, mas apenas quando ocorrer o efeito da revelia denominado confissão ficta e já estudamos que isso nem sempre ocorre. O ideal, em homenagem ao princípio da cooperação, é que o juiz intime as partes de que julgará antecipadamente a lide. Se parte não impugnar, não poderá depois alegar cerceamento de defesa.

5ª – O juiz realizará audiência preliminar: se não era caso de extinção do processo previsto nas hipóteses anteriores e o direito admite autocomposição, o juiz deve marcar audiência preliminar para tentar conciliar as partes. Se não houver conciliação, o juiz terá de fazer duas coisas: fixar os pontos controvertidos e organizar a atividade instrutória. Por isso se diz que essa audiência tem esse tríplice escopo (conciliação, fixação de pontos controvertidos e organização da atividade instrutória). Porém, não se deve comparar tal audiência com a dos juizados especiais, pois aqui, o não comparecimento da parte não importa na extinção do processo, apenas que não quis a conciliação.

6ª – O juiz proferirá “despacho saneador”: se não era caso de extinção do processo nas hipóteses anteriores e o direito não admitia autocomposição ou quando ela for improvável (casos em que não haverá audiência preliminar), o juiz proferirá o chamado “despacho saneador”. Essa denominação é muito conhecida, mas em verdade, não se trata de despacho e sim de decisão interlocutória, escrita, que tem duas partes muito claras: uma parte declaratória, onde o juiz verifica que até agora está tudo certo com o processo e não é caso de julgamento do processo. Por isso se diz que esse “despacho saneador”, não é nem despacho e tampouco saneador, uma vez que o processo já terá sido saneado com as providências preliminares. O “despacho saneador”, apenas declara que as providências preliminares tiveram êxito no saneamento do processo. Mas há uma parte constitutiva no “despacho saneador”: o juiz vai fixar os pontos controvertidos e organizar a atividade instrutória.


O juiz julga parcialmente a lide – Pode acontecer que uma das hipóteses anteriores diga respeito apenas a uma parte do processo. Pode acontecer que haja vários pedidos na petição inicial e em relação a alguns o juiz pode julgar em um momento e outros não (ex: um dos pedidos prescreveu e o outro não). A existência de decisão parcial, ou seja, de um julgamento conforme o estado do processo que diga respeito apenas a um pedaço do processo, hoje, é indiscutível. O que se discute sobre essa decisão é a sua terminologia. Uns preferem chamar de sentenças parciais. Outros chamam de decisões interlocutórias. Ambos concordam que essas decisões existem e que elas não extinguem o processo. Para quem entende que são decisões interlocutórias, o recurso cabível é o de agravo de instrumento. Para quem entende que é sentença parcial, existem 3 concepções: a) agravo de instrumento; b) apelação e; c) apelação por instrumento. Notem que essa decisão interlocutória pode ser de mérito e, como tal, serão definitivas, ou seja, aptas a produzir coisa julgada material, aptas a serem executadas e inclusive serem alvos de ação rescisória.














Notas de Aula - Teoria geral da prova







TEORIA GERAL DA PROVA




3 Acepções da palavra “prova”

Fonte de prova (tudo aquilo que pode extrair prova: pessoas, coisas, fenômenos ex: cheiro, erosão, luar, hematoma etc);

Meio de prova (modo como se introduz prova em um processo: testemunhal, documental, pericial, depoimento da parte).Obs.: a testemunha é FONTE DE PROVA mas não é MEIO DE PROVA. É o testemunho o meio de prova. A testemunha é a fonte.

→ Prova como resultado (convencimento a que chega o juiz. A conclusão a que se chega. O resultado da convicção na mente do juiz). Acepção subjetiva.



Duas normas fundamentais:



Princípio da atipicidade dos meios de prova (art. 332 do CPC/1973). Qualquer meio de prova, mesmo não previsto em lei, é válido, desde que não seja expressamente proibido. 

No novo CPC, é previsto expressamente no art. 369: "As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz."




Ex: prova emprestada (não está previsto em lei, nem vedado).



A prova emprestada é admissível DESDE QUE:


* não seja possível a repetição da prova OU que a produção seja muito onerosa;

* seja observado o contraditório (a prova foi produzida com a participação daquele contra quem quero usar a prova). Inclusive a intercepção telefônica no processo penal é possível de utilização como prova emprestada no processo civil.



Princípio da vedação da utilização de provas ilícitas: Meio de prova ilícito é meio de prova que de alguma maneira viola alguma norma jurídica.

Dimensão constitucional do direito à prova: o direito à prova decorre direitamente do contraditório (faz parte de seu conteúdo).

1a Dimensão: o direito de produzir a prova (para que a parte possa buscar a proteção de seus interesses. 

2a Dimensão: o direito de participar da produção da prova. Ex: direito das partes de ser informadas da data e local em que a perícia será feita, para que possam fiscalizar a produção da prova. 

3a Dimensão: o direito de se manifestar sobre a prova produzida: 

4a Dimensão: o direito à valoração da prova (direito das partes de exigir que a prova produzida seja valorada pelo juiz, ou seja, dizer qual é o valor que ele atribui a prova).

Obs.: atualmente, dá-se importância muito grande ao direito de produzir a prova. Muitos defendem que o direito à produção da prova pode ser um processo autônomo (o novo CPC prevê essa ação no art. 381, §5º)). Fala-se, então, em ação probatória autônoma (ação de obtenção antecipada da prova).

Aquisição processual da prova: a prova produzida pertence ao processo, pouco importando quem a produziu. Não é expressamente previsto no CPC/1973, mas amplamente admitido e previsto no novo CPC, art. 371: "O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento."

Poder instrutório do Juiz: no Brasil, o juiz tem poder instrutório. Pode produzir provas de ofício (art. 130 do CPC, art. 370, novo CPC). É um poder paralelo ao das partes. O juiz NÃO precisa esperar a inércia das partes para produzir provas. Pode fazer isso independente do comportamento das partes.
No processo penal, há grande discussão sobre o poder instrutório do juiz, mas no processo civil, atualmente essa discussão não existe mais no Brasil. Não importem para o processo civil essa discussão hoje existente no processo penal.
Relação entre prova e verdade: o nosso sistema determina que o juiz busque a verdade. Mas essa busca da verdade não é eterna. Será que a prova serve para revelar a verdade? Qual a verdade que se busca revelar com a produção da prova? Tradicionalmente a doutrina dividia a verdade em duas: verdade real (o que de fato aconteceu) e a verdade formal (verdade construída pelas partes. A verdade dos autos). Se disse que o processo civil se contentava com a verdade formal e o processo penal seria o da verdade real. Hoje, essa divisão está SUPERADA.
Nem sequer no processo penal a verdade real se mantém (o exemplo disso é a possibilidade da transação penal). 

O objeto é resolver o problema. Se o juiz tem poderes instrutórios no processo civil, é óbvio que o processo civil não se contenta com a verdade formal.


A verdade real sequer existe. É uma ideia inalcançável. Tudo o que a gente sabe sobre o passado a gente sabe porque alguém nos contou, seja escrita, seja oralmente. Quem conta o que viu, conta de acordo com o modo como ele vê as coisas. Se colocarmos dois pintores diante de um mesmo pôr do sol, o quadro sairá segundo o modo de ver de cada um. A verdade é construída de acordo com o convencimento (individual e coletivo). Nos sistemas tirânicos, a verdade é construída apenas por um ou poucos. Num sistema democrático, a verdade é construída coletivamente. O segredo da verdade consiste em saber que não existem fatos, só existem estórias. Prevalece a versão mais bem contada e mais bem provada.


A verdade que se busca no processo civil é a verdade possível. A verdade que pode ser construída licitamente.


O que se busca provar? A prova recai sobre as alegações DE FATO. Qualquer fato, jurídico (ex: existência de um contrato) ou não jurídico (ex: cor da camisa do sujeito), preenchidos 3 requisitos:


* Fato determinado (delimitado no tempo e no espaço);
* Fato controvertido;
* Fato relevante.


O fato negativo pode ser objeto de prova? Ex: sim, desde que seja um fato determinado. Ex: certidão negativa de débitos tributários. Certidão negativa de antecedentes criminais. O direito positivo pode ser objeto de prova? Direito municipal, estadual, consuetudinário e estrangeiro, se o juiz não souber nada a respeito deles, poderá convocar a parte interessada a produção de prova do teor e da vigência dele. O Direito Federal independe de prova (iura novit curia). Art. 337 CPC/1973 e art. 376 do novo CPC:

Art. 334 do CPC/1973 e 374 do novo CPC: não dependem de prova:

* os fatos notórios (conhecimento de todos em uma dada comunidade em um dado momento histórico); Ex: queda das torres gêmeas nos EUA. Dilma é a presidente do Brasil, etc.
* Fatos afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária (a confissão dispensa, pois torna o fato incontroverso). É expressa. Exige poderes especiais. É um ato jurídico em sentido estrito;
* Fatos admitidos (conduta tácita) por uma parte. É tácita. NÃO exige poderes especiais. É um ato-fato;
* Fatos em cujo favor limita a presunção legal de existência ou de veracidade.



Duas formas de presunção legal: absoluta (iure et de jure. Ex: quem compra um imóvel em cuja matrícula tenha sido averbada uma penhora, presume-se ciente da penhora. Art. 659, § 4º, CPC. Quem se casa autorizou o cônjuge a contrair dívidas para a economia doméstica e ambos respondem por essas dívidas ) e relativa (juris tantum: admite prova em contrário. Ex: presunção de veracidade da declaração de pobreza. Presunção de maternidade/parternidade decorrente da recusa a se submeter a exame de DNA).

Sistemas de apreciação da prova pelo juiz: 

Sistema da convicção livre: o juiz era livre para valorar as provas e podia decidir de acordo com sua convicção íntima. Esse sistema foi praticamente abolido, embora haja resquício (tribunal do júri). 

Sistema da prova legal ou tarifada: o juiz não pode valorar as provas. Elas têm o valor que a lei determinar. É o legislador quem valora as provas. Não vige mais no Brasil (salvo alguns resquícios). 

Sistema da persuasão racional ou livre convencimento motivado: o juiz poderá valorar as provas livremente, mas deve observar uma série de garantias. É o livre convencimento com limitações. As provas não têm um valor pré-definido, mas ele deve observar uma série de garantias (art. 131 do CPC/1973 e 370 do novo CPC). A motivação tem que existir e tem que ser racional. O juiz não pode decidir com base em critérios de fé religiosa. 

O livre convencimento não pode contrariar as regras da experiência (ex: a duração da gravidez da mulher é de no máximo nove meses). A máxima da experiência é uma regra que se constrói a partir da observação do que de ordinário acontece. São produto da cultura humana.

As máximas da experiência também têm outras utilidades: ajudam o juiz na hora de concretizar conceitos jurídicos indeterminados (ex: preço vil); auxiliam o juiz a constrastar as provas (ex: a testemunha suava muito e gaguejava quando falava. Já outra testemunha era mais firme e não titubeava); também auxiliam o juiz a formular.


Presunções judiciais (também chamadas de presunções simples): são presunções feitas pelo juiz no caso concreto. É o resultado de uma operação lógica feita pelo juiz. Presumir é ter por provado determinado fato. É feita através do silogismo (premissa maior + premissa menor = conclusão): a premissa maior é a máxima da experiência. A premissa menor é o indício). Indício: é um fato que se liga/relaciona com outro fato. Provado o indício, presume-se que o outro fato ocorreu. O indício INDICA, APONTA esse outro fato. Ex: marca de batom na cueca é um indício de traquinagem. É um indício forte que uma vez provado, se pode presumir, ter por ocorrida a traquinagem. Ex: a morte de filho indica sofrimento dos pais. Uma vez provada a morte do filho, pode-se presumir que os pais sofreram.

A presunção judicial NÃO é meio de prova. Já é o convencimento do juiz. É produzido a partir da prova de outro fato. O indício é uma prova INDIRETA. O indício prova um fato com a prova de outro. É híbrido. É a um só tempo meio de prova e objeto de prova, pois ele é um fato.


O indício é uma prova INDIRETA. O indício prova um fato com a prova de outro. É híbrido. É a um só tempo meio de prova e objeto de prova, pois ele é um fato.

Obs.: dano moral se prova por indício. Eu presumo o dano moral a partir de indícios (ex: morte de filho, inscrição no serasa, dano estético). Se o dano moral se presume, é porque há um indício (reforçado pela regra da experiência.

Ônus da prova Dimensão subjetiva: é uma norma que orienta como as partes devem se comportar no processo. As partes vão se comportar no processo, traçar suas estratégias de acordo com as regras do ônus da prova. Dimensão objetiva: é uma regra de julgamento que estabelece quem arcará com a falta de prova de determinado fato. As regras de ônus da prova determinam quem responde pela falta de prova. Não dizem quem tem de provar. Não determinam quem tem de provar. Determinam quem responde se NÃO houver prova.

Ter o ônus da prova não significa ter de produzir a prova, pois ela pode vir da outra parte ou mesmo do juiz. É irrelevante saber quem produziu a prova. Se vier a prova que me favorece, eu me desincumbi do ônus, mesmo que não tenha sido eu que a produzi.

É uma regra de aplicação subsidiária, pois o juiz só decide com base no ônus da prova se não houver possibilidade de produzir prova. Se ainda houver a possibilidade de produzir prova, deve o juiz determinar a prova de ofício. Art. 333 do CPC e 373 do novo CPC: o ônus da prova incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo do direito e ao réu, quanto ao fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. 

As partes podem convencionar de outra forma, DESDE QUE não recaia sobre direito indisponível OU não torne excessivamente onerosa ou difícil o exercício do direito. (art. 333, parágrafo único, CPC/1973 e art. 373, § 3º, novo CPC). 

É uma distribuição estática, mas há situações em que a prova do fato pode ser impossível ou excessivamente difícil. Nesses casos, surge a prova diabólica. Ex: a CF diz que aquele que não tem outro imóvel pode adquirir imóvel por usucapião especial. Como provar que não tem imóvel no mundo inteiro? É uma prova diabólica. Há casos em que a prova contraria é muito mais fácil. O acesso que a outra parte tem para provar que o qua outra está mentindo é muito mais simples do que o inverso. Nesses dois casos, exigir de quem afirma o fato o ônus da prova é muito brutal e fere a igualdade. Por isso a doutrina começou a defender uma teoria que prega a possibilidade de o juiz redistribuir o ônus da prova sempre que um desses dois pressupostos acontecer. 

É a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova. Se baseia nos princípios da igualdade e da adequação. Já há diversos precedentes judiciais aplicando essa teoria e no novo CPC ela é prevista no art. 373, § 1º: "Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído".


Mas se o juiz for redistribuir o ônus da prova, deve dar a outra parte a ciência prévia da redistribuição, sob pena de violar o princípio do contraditório. O STJ tem entendido dessa forma. Não é possível redistribuir o ônus da prova na sentença.


A redistribuição do ônus da prova não pode implicar na prova diabólica para a outra parte. É o que determina expressamente o art. 371, § 2º do novo CPC: "A decisão prevista no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil."


Obs.: não confundir esse assunto (redistribuição do ônus da prova) com a INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA prevista no CDC. É inversão dinâmica do ônus da prova nas causas de consumo só pode ser em favor do consumidor em caso de hipossuficiência ou verossimilhança.












segunda-feira, 25 de maio de 2015

Peças relevantes: Pedido de ingresso da DPU como amicus curiae na ADI n. 5.296 (ADI contra a EC n. 74 - Autonomia da DPU)




DPGF Haman  Córdova
 No dia 10 de abril de 2015, portanto, quase dois anos após a promulgação da EC nº 74/2013 (que se deu em 6/8/2013), a presidente da República, Dilma Rousseff, ajuizou a ADI n. 5.296, requerendo fosse declarada a inconstitucionalidade da referida emenda, com fundamento em dois esdrúxulos argumentos: a) vício formal por suposta violação à regra da iniciativa reservada ao presidente da República (art. 61, parágrafo 1.º, II, “c” – iniciativa para dispor sobre o regime jurídico dos servidores públicos da União); b) por consequência, violação à cláusula pétrea da separação de poderes (art. 60, parágrafo 4.º, III).

 A Defensoria Pública da União, por intermédio do Defensor Público-Geral Federal Haman Tabosa de Moraes e Córdova, pediu o ingresso no feito como amicus curiae com fito de defender a constitucionalidade da EC n. 74/2013.

 Quando a tese de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa, adotada na inicial da referida ADI, merece destaque a manifestação da DPU, dentre os vários argumentos colacionados, os de que "não há na história do Supremo Tribunal Federal nenhum julgamento de mérito que, adotando a tese veiculada na presente ADI,  tenha limitado o exercício do Poder Constituinte Derivado, de modo que os julgados trazidos pela d. AGU não possuem qualquer potencial de se amoldar ao caso concreto" e que  "o STF já teve oportunidade de enfrentar a matéria em análise de forma definitiva. Tal ocorreu quando do julgamento do mérito da ADI n.º 3367/DF, que analisou a constitucionalidade abstrata dos artigos 1º e 2º da Emenda Constitucional n. 45/2004 – EC 45/2004, de “iniciativa parlamentar” que, entre outras medidas, introduziu na ordem jurídica brasileira, como órgão do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ.".

   A Defensoria Pública da União assevera, ainda, que a própria Advocacia Geral da União já manifestou-se pela constitucionalidade da autonomia administrativa e orçamentária conferida às Defensorias Estaduais e defendeu a necessidade de estender essa autonomia a DPU, em cumprimento a simetria que rege a Defensoria Pública como um todo. Isso ocorreu no julgamento da ADI n. 4282. Vide manifestação do Advogado-Geral e hoje ministro do STF, Dias Toffoli:


"Com efeito, conforme decidido nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.307, ‘o modelo de federalismo de equilíbrio adotado no Brasil acolhe o princípio da simetria, segundo o qual há uma principiologia a harmonizar as estruturas e as regras que formam o sistema nacional e os sistemas estaduais, de tal modo que não destoem os modelos adotados no plano nacional e nos segmentos federados em suas linhas magnas’. Entendeu-se, em tal caso, ser obrigatória a adoção, pelos Estados, do modelo federal de organização do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público que perante ele atua.

Assim, há que se concluir que o princípio da simetria inviabiliza a concessão de autonomia funcional, administrativa e orçamentária exclusivamente às Defensorias Públicas dos Estados, sem estender semelhantes prerrogativas à Defensoria Pública da União.

Entendimento diverso importaria, ademais, em ofensa ao princípio da isonomia, por injustificadamente sujeitar a tratamento diferenciado os sujeitos assistidos pelas Defensorias Públicas dos Estados e aqueles assistidos pela Defensoria Pública da União. De fato, se as autonomias referidas não lhe forem estendidas, a Defensoria Pública da União não gozará das mesmas condições disponibilizadas aos órgãos estaduais para a prestação adequada do serviço de assistência jurídica.
(...)
Contudo, diante da realidade das Defensorias criadas após a Constituição de 1988, o constituinte derivado pretendeu reforçar suas prerrogativas institucionais, a fim de que pudessem desempenhar adequadamente as tarefas que lhes forem destinadas. Assegurou-lhes, então, o recebimento dos recursos correspondentes às dotações orçamentárias até o dia 20 (vinte) de cada mês (art. 168 da Carta Política), e conferiu, expressamente, autonomia funcional, administrativa e iniciativa para proposta orçamentária às Defensorias Públicas estaduais.
(…)
Enfim, o Governo Federal conclui ser necessário assegurar às Defensorias Públicas as garantias consideradas indispensáveis à consecução de suas finalidades institucionais. Assim, nota-se que o reconhecimento à Defensoria Pública da União de autonomia funcional e administrativa, bem como de iniciativa para formular a respectiva proposta orçamentária, encontra amparo nos princípios da isonomia (artigo 5°, caput, da Constituição) e da simetria, decorrente do pacto federativo (artigo 60, §4º, inciso I, da Lei Maior).” (grifos no original). 

  Quanto a alegada inconstitucionalidade material alegada pela presidente da República, destaca-se o seguinte trecho da manifestação protocolada pela DPU:

"Declarar a inconstitucionalidade da EC 74/2013 e, consequentemente, retirar a autonomia da DPU e da DP/DF é atividade manifestamente incompatível com a essência do texto constitucional no tocante ao acesso à Justiça por parte da população carente do país.

Ademais, é medida que gera lesão à isonomia na oferta dessa assistência jurídica ao cidadão necessitado, na medida em que, nas causas típicas da Justiça Estadual, estará ele certamente muito mais bem servido, aparelhado e protegido do que naquelas típicas da Justiça Federal.

Noutro giro, haveria ainda uma deformação no pacto federativo e na própria estrutura pretendida pelo Constituinte originário para a Defensoria Pública, que, a julgar pela lei complementar nacional exigida pelo então parágrafo único do art. 134 da Constituição, sempre visou à unidade, à indivisibilidade e a harmonia dessa nobre Instituição.

Somente dotando a Defensoria Pública brasileira dos instrumentos conferidos por meio das Emendas Constitucionais nºs 45/2004, 69/2012, 74/2013 e 80/2014, poderá o Estado Brasileiro cumprir, em toda a sua complexidade federativa, o que restou determinado pela mais recente conquista do acesso à Justiça na história constitucional brasileira: “contar com defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais” no prazo de oito anos (§ 1º do art. 98 do ADCT, introduzido pela Emenda Constitucional nº 80/2014).

Sem a autonomia que lhe fora conferida por meio da EC 74/2013, a União, por meio da DPU, não conseguirá, na esfera federal, materializar o princípio do acesso à Justiça e garantir de que será disponibilizado à população em situação de vulnerabilidade social o serviço público de assistência jurídica integral e gratuita assegurado no art. 5º, LXXIV da CF/88."

Faça o download do inteiro teor da manifestação clicando aqui

domingo, 24 de maio de 2015

Enunciados Aprovados II Jornada de Direito da Saúde promovida pelo CNJ





Enunciados Aprovados II Jornada de Direito da Saúde, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça nos dias 18 e 19 de maio em São Paulo. 



46 – Saúde Pública - As ações judiciais para as transferências hospitalares devem ser precedidas de cadastro do paciente no serviço de regulação de acordo com o regramento de referência de cada Município, Região ou do Estado.

47 - Saúde Pública - Não estão incluídos na competência dos juizados especiais da fazenda pública os casos em que se pretende o fornecimento de medicamento e/ou tratamento cujo custo anual superar o limite da competência dos referidos juizados.

48 – Saúde Pública - As altas de internação hospitalar de paciente, inclusive de idosos e toxicômanos, independem de novo pronunciamento judicial, prevalecendo o critério técnico profissional do médico.

49 – Saúde Pública - Para que a prova pericial seja mais fidedigna com a situação do paciente, recomenda-se a requisição do prontuário médico.

50 - Saúde Pública - Salvo prova da evidência científica e necessidade preemente, não devem ser deferidas medidas judiciais de acesso a medicamentos e materiais não registrados pela ANVISA ou para uso off label. Não podem ser deferidas medidas judiciais que assegurem o acesso a produtos ou procedimentos experimentais.

51 - Saúde Pública - Nos processos judiciais, a caracterização da urgência/emergência requer relatório médico circunstanciado, com expressa menção do quadro clínico de risco imediato.

52 - Saúde Pública - Nas ações reiteradas na mesma Comarca que apresentem pedidos de medicamentos, produtos ou procedimentos já previstos nas listas oficiais, como medida de eficácia da atuação jurisdicional, é pertinente o magistrado dar ciência dos fatos aos Conselhos Municipal e Estadual de Saúde.

53 – Saúde Pública - Mesmo quando já efetuado o bloqueio de numerário por ordem judicial, pelo princípio da economicidade, deve ser facultada a aquisição imediata do produto por instituição pública ou privada vinculada ao SUS, observado o preço máximo de venda ao governo – PMVG, estabelecido pela CMED.

54 - Saúde Pública – Havendo valores depositados em conta judicial, a liberação do numerário deve ocorrer de forma gradual mediante comprovação da necessidade de continuidade do tratamento postulado, evitando-se a liberação única do montante integral.

55 – Saúde Pública - O levantamento de valores para o cumprimento de medidas liminares nos processos depende da assinatura de termo de responsabilidade e prestação de contas periódica.

56 – Saúde Pública - Havendo depósito judicial por falta de tempo hábil para aquisição do medicamento ou produto com procedimento licitatório pelo poder público, antes de liberar o numerário é prudente, sempre que possível, que se exija da parte a apresentação prévia de três orçamentos.

57 – Saúde Pública - Em processo judicial no qual se pleiteia o fornecimento de medicamento, produto ou procedimento, é recomendável verificar se a questão foi apreciada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS – CONITEC.

58 – Saúde Pública - Quando houver prescrição de medicamento, produto, órteses, próteses ou procedimentos que não constem em lista (RENAME /RENASES) ou protocolo do SUS, recomenda-se a notificação judicial do médico prescritor, para que preste esclarecimentos sobre a pertinência e necessidade da prescrição, bem como para firmar declaração de eventual conflito de interesse.

59 - Saúde Pública - As demandas por procedimentos, medicamentos, próteses, órteses e materiais especiais, fora das listas oficiais, devem estar fundadas na Medicina Baseada em Evidências.

60 – Saúde Pública - A responsabilidade solidária dos entes da Federação não impede que o Juízo, ao deferir medida liminar ou definitiva, direcione inicialmente o seu cumprimento a um determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento.

61- Saúde Pública - Proposta de alteração do enunciado n°4 da I Jornada - Os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) são elementos organizadores da prestação farmacêuticas, de insumos e de procedimentos, e não limitadores. Assim, no caso concreto, quando todas as alternativas terapêuticas previstas no respectivo PCDT já tiverem sido esgotadas ou forem inviáveis ao quadro clínico do paciente usuário do SUS, pelo princípio do art. 198, II, da CF, pode ser determinado judicialmente o fornecimento, pelo Sistema Único de Saúde, do fármaco, insumo ou procedimento não protocolizado.

62 - Saúde Suplementar -Para fins de cobertura assistencial, o conceito de urgência e emergência deve respeitar a definição legal contida no art. 35-C, Lei Federal 9.656/98.

63 – Saúde Suplementar -O deferimento de cirurgia bariátrica em tutela de urgência sujeita-se à observância das diretrizes constantes da Resolução CFM nº 1942/2010 e de outras normas que disciplinam a matéria.

64 - Saúde Suplementar -A atenção domiciliar não supre o trabalho do cuidador e da família, e depende de indicação clínica e da cobertura contratual.

65 - Saúde Suplementar -Não é vedada a intervenção de terceiros nas demandas que envolvam plano de saúde.

66 – BioDireito - Poderá constituir quebra de confiança passível de condenação por dano, a recusa imotivada em fornecer cópia do prontuário ao próprio paciente ou seu representante legal ou contratual, após comprovadamente solicitado, por parte do profissional de saúde, clínica ou instituições hospitalares públicos ou privados.

67 – BioDireito - As informações constantes do receituário médico, para propositura de ação judicial, devem ser claras e adequadas ao entendimento do paciente, em letra legível, discriminando a enfermidade pelo nome e não somente por seu código na Classificação Internacional de Doenças – CID, assim como a terapêutica e a denominação genérica do medicamento prescrito.

68 – BioDireito - Os direitos reprodutivos correspondem ao conjunto de direitos básicos relacionados com o livre exercício da sexualidade e da reprodução humana.