EXCELENTÍSSIMO(A)
SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 16ª VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO
DISTRITO FEDERAL
Autos Nº xxx
PAJ n, XXX
XXXX, já
qualificado nos autos em epígrafe, patrocinado pela DEFENSORIA
PÚBLICA DA UNIÃO, não se
conformando com o teor da r. sentença prolatada em 19 de fevereiro
de 2013, vêm à respeitosa
presença de Vossa Excelência, com fulcro no art. 513 do CPC, interpor o presente recurso de
APELAÇÃO
|
pelos
motivos a seguir delineados nas páginas em anexo, pugnando pelo seu
recebimento no efeito devolutivo, remetendo-o para processamento e
julgamento pelo E. TRF da 1ª Região.
Pede Deferimento.
Brasília, 08 de maio de 2013.
ALEXANDRE MENDES LIMA DE OLIVEIRA
Defensor Público Federal
Egrégio Tribunal,
Colenda Turma,
Colenda Turma,
Eminente
Relator,
I - DA INTIMAÇÃO
PESSOAL, DO PRAZO EM DOBRO E DA DISPENSA DE PROCURAÇÃO:
Cumpre informar que a Lei Complementar
nº 80, de 12 de janeiro de 1994, em seu art. 44, I, preceitua, in
verbis:
Art. 44- São
prerrogativas dos membros da Defensoria Pública da União:
I receber, inclusive
quando necessário, mediante
entrega dos autos com vista,
intimação
pessoal
em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância
administrativa, contando-se-lhes
em dobro todos os prazos;
Saliente-se que a ausência de
intimação, uma vez comprovado o prejuízo, consubstancia nulidade
absoluta, eis que afronta
os princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e
devido processo legal. A Jurisprudência tem respeitado essa
prerrogativa dos membros da Defensoria Pública, mesmo antes da
vigência da LC nº 80/94, assentando que “A
Defensoria Pública, nos termos do § 5º do art. 5º da Lei
1.060/1950, possui as prerrogativas de intimação
pessoal e de prazo
em dobro” (STJ, EDAGA
nº 906012, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, unânime, DJ
24/03/2009).
Acrescente-se, ainda, que
a intimação
pessoal deverá se dar em
relação a todos os atos
do processo, sob pena
de nulidade, como preconiza o STJ:
“ADMINISTRATIVO E
“PROCESSUAL CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. DEFICIENTE AUDITIVO. EXCLUSÃO
DO BENEFÍCIO DA RESERVA DE VAGA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE.
AUSÊNCIA
DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA DEFENSORIA PÚBLICA
PARA PRODUÇÃO DE PROVAS. PREJUÍZO MANIFESTO DO AUTOR. NULIDADE.
PRECEDENTES.
(...)
A jurisprudência
desta Corte é pacífica no sentido de que o Defensor
Público
deve ser intimado
pessoalmente de
todos
os atos do processo,
sob
pena de nulidade
3. Agravo regimental
desprovido.”
(STJ, AGRESP nº
1057240, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, unânime, DJ 17/11/2008).
Assim, desde já
requer sejam respeitadas essas prerrogativas institucionais dos
membros da Defensoria Pública da União, sob pena de nulidade
absoluta.
II - SÍNTESE FÁTICA
O autor, a fim de exercer a profissão
de vigilante, inscreveu-se no curso técnico da Academia XXX,
concluindo-o em xxx,
conforme documentos em anexo.
Seu diploma, no entanto, não pôde
ser devidamente retirado, por conta de óbice apresentado pela
Polícia Federal.
O Sr. xxx, segundo o
ofício recebido, não preenchia os quesitos do art. 4° da Lei
10.826/2003, a saber:
Art. 4o
Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá,
além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes
requisitos:
I
- comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões
negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal,
Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito
policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por
meios eletrônicos; (Redação
dada pela Lei nº 11.706, de 2008)
O ora apelante foi denunciado por
crimes atinentes aos artigos 155 § 4°, IV e 69 do Diploma Penal,
por fato ocorrido em 1990, tendo
sido extinta a punibilidade por prescrição.
Tal disposição impediu que o autor
obtivesse devidamente o registro de conclusão do curso.
A União, em defesa de seus
interesses, menciona o artigo 38, do decreto n.5.123/2004:
“ a autorização
para uso de arma de fogo expedida pela Polícia Federal, em nome das
empresas de segurança privada e de transporte de valores, será
precedida, necessariamente, da comprovação do preenchimento de
todos os requisitos constantes do art. 4° da Lei n° 10.826, de
2003, pelos empregados autorizados a portar arma de fogo.”
O magistrado de piso julgou
improcedente o pedido formulado na inicial.
A sentença, com a devida vênia,
merece reforma.
III - RAZÕES PARA A REFORMA DA SENTENÇA
DA VIOLAÇÃO AO ART. 5º, II, XIII E LVII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Ao
restringir o direito do recorrente de exercer sua profissão, a
sentença recorrida violou frontalmente os incisos II e XIII e LVII,
do artigo 5º, da Constituição Federal, ipsis
literis:
“Art. 5º
Todos
são iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
XIII - é livre o
exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as
qualificações profissionais que a lei estabelecer; (...)
Se a Constituição Federal garante o
exercício de qualquer profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei
estabelecer, não pode ato
normativo infra legal restringir o direito de exercício
profissional.
O exercício da profissão de
Vigilante é regulado pela Lei nº 7.102 de 20 de junho de 1983, a
qual estabelece no seu artigo 16 as condições para o exercício da
profissão de Vigilante:
“Art.
16 - Para
o exercício da profissão, o vigilante preencherá os
seguintes
requisitos:
I
- ser brasileiro;
II
- ter idade mínima de 21 (vinte e um) anos;
III
- ter instrução correspondente à quarta série do primeiro grau;
IV
- ter sido aprovado, em curso de formação de vigilante, realizado
em estabelecimento com funcionamento autorizado nos termos desta lei.
(Redação dada pela Lei nº 8.863, de 1994)
V
- ter sido aprovado em exame de saúde física, mental e
psicotécnico;
VI
- não ter antecedentes criminais registrados;
e
VII
- estar quite com as obrigações eleitorais e militares.
Parágrafo
único - O requisito previsto no inciso III deste artigo não se
aplica aos vigilantes admitidos até a publicação da presente
Lei”(g.n.)
A lei de regência exige a
inexistência de antecedentes criminais registrados para o exercício
da profissão de Vigilante, id
est, o
Vigilante ou futuro Vigilante não pode ter condenação criminal
transitada em julgado com punibilidade não extinta. Certamente
essa é a única interpretação lícita possível do dispositivo
infraconstitucional.
No presente caso, de acordo com a certidão acostada
aos autos, o ora apelante não apresenta antecedentes criminais.
No entanto, a Diretoria Geral da
Polícia Federal, no uso de sua atribuição regulamentar, extrapolou
sua competência e feriu o princípio da inocência ao exigir que os
Vigilantes comprovem, através de certidões, não ter qualquer
condenação penal registrada. Assim prescreve o artigo 109 da
Portaria nº 387/2006, expedida pela Diretoria Geral do Departamento
de Polícia Federal:
“Art. 109. Para o
exercício da profissão, o vigilante deverá preencher os
seguintes requisitos,
comprovados documentalmente:
I - ser brasileiro,
nato ou naturalizado;
ll - ter idade mínima
de 21 (vinte e um) anos;
III - ter instrução
correspondente à quarta série do ensino fundamental;
IV - ter sido aprovado
em curso de formação de vigilante, realizado por empresa de curso
de formação devidamente autorizada;
V - ter sido aprovado
em exames de saúde e de aptidão psicológica;
VI - ter idoneidade
comprovada mediante a apresentação de antecedentes criminais, sem
registros de indiciamento em inquérito policial, de estar sendo
processado criminalmente ou ter sido condenado em processo criminal;
VII - estar quite com
as obrigações eleitorais e militares;
VIII - possuir
registro no Cadastro de Pessoas Físicas.”(g.n.)
Ora, se a Lei nº 7.102/1983 exige
apenas certidão de antecedentes criminais, na qual pode constar
apenas eventual condenação criminal já transitada em julgado com
punibilidade não extinta, em respeito ao princípio da inocência,
não pode o Diretor Geral da Polícia Federal, usando seu poder
regulamentar, aumentar as exigências para exercício profissional do
Impetrante.
Ademais, ainda que lei houvesse
vedando a expedição do certificado por conta de condenação penal
com punibilidade extinta, tal lei seria obviamente INCONSTITUCIONAL
por violação ao princípio da presunção de não culpabilidade,
previsto no art. 5º, LVIII, da CF.
Ademais, é sabido que a condenação
criminal não pode ter efeitos perpétuos sobre a pessoa do apenado,
mesmo ainda para impedi-lo de exercer a profissão, sob pena de
ofensa aos princípios constitucionais da razoabilidade e da
dignidade da pessoa humana.
É esse o entendimento do TRF da 1ª
Região:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE
SEGURANÇA. HOMOLOGAÇÃO DO CERTIFICADO DO CURSO DE VIGILANTE.
AUSÊNCIA DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. POSSIBILIDADE. PRESUNÇÃO
DE INOCÊNCIA. ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
I - Não
obstante se reconheça a legitimidade da exigência de idoneidade
moral para o exercício profissional de vigilante, o fato de o
impetrante ter figurado como réu em eventual processo penal, não
tem o condão, por si só, de configurar a ausência daquele
requisito, até que seja efetivamente considerado culpado, com o
trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, em
observância ao princípio constitucional da presunção de inocência
(art. 5º, LVII, da CF/88). Precedentes.
II - Na
hipótese dos autos, em que pese o impetrante ter respondido a dois
processos penais, verifica-se que nenhum dos referidos processos
culminou em uma sentença penal condenatória, a caracterizar, na
espécie, a ilegalidade do ato praticado pela autoridade coatora, que
não homologou o Certificado do Curso de Vigilante do apelado.
III - Apelação e Remessa Oficial
desprovidas. Sentença confirmada.
(grifo nosso) (TRF 1ª Região,
Numeração Única: 0015237-79.2009.4.01.3400, 5ª Turma, Rel. Des.
Federal Souza Prudente, e-DJF1 19/09/2012, p. 44)
“ADMINISTRATIVO. PENAL.
HOMOLOGAÇÃO DE
CERTIFICADO DE CURSO DE RECICLAGEM DE VIGILANTE. ANTECEDENTES
CRIMINAIS. CUMPRIMENTO DA PENA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.
1. Os fatos ocorreram em 1999 e
2004. Tendo a
pretensão punitiva sido extinta por cumprimento da pena, não seria
razoável impor-se ao apelado os efeitos da condenação
perpetuamente.
2. Apelação provida.” (grifo
nosso)
(TRF 1ª Região, AMS
0035136-97.2008.4.01.3400/DF, 5ª Turma, Rel. Juiz Federal Convocado
Alexandre Laranjeiras, unânime, DJ 15/04/2011)
“ADMINISTRATIVO. REGISTRO
DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO DE VIGILANTES.
LEI 7.102/83. CONDENAÇÃO CRIMINAL POR ESTUPRO. CUMPRIMENTO INTEGRAL
DE PENA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. ART. 64, I, DO CÓDIGO
PENAL. ART. 5º, XLVII, B), DA CONSTITUIÇÃO.
RECURSO PROVIDO.
1. O art. 16, VI, da Lei 7.102/93
exige para o exercício da profissão de vigilante não ter
antecedentes criminais registrados.
2. A
condenação do candidato a vigilante por dois estupros, com
cumprimento da pena há mais de seis anos, não representa empecilho
ao registro do certificado do curso. A uma, porque o efeito de uma
condenação penal desaparece depois de cinco anos do cumprimento da
pena, nos termos do art. 64, I, do Código Penal. A duas, porque a
pena não pode gerar efeitos indefinidamente, pela proibição de
pena de caráter perpétuo, a teor da alínea b) do inciso XLVII do
artigo 5º da Constituição.
3. Apelação provida para
determinar o registro do certificado do viligante.” (grifo nosso)
(TRF 1ª Região, AC
0033643-22.2007.4.01.3400/DF, 5ª Turma, Rel. Juiz Federal Convocado
Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, unânime, e-DJF1 18/02/2011, p.
103)
Os antecedentes criminais, como se vê,
seriam óbices para que, posteriormente, a atividade de
vigilância-que inclui o porte de armas- pudesse ser exercida.
Em verdade, o que transparece do
ofício emitido pela PF é que parece ser vedado, ao indivíduo já
punido pela Lei, exercer atividade honesta, por suposta chaga
espiritual, espécie
de signo mefistofélico que
o acompanha, qual cão sarnento, pelas tortuosas sendas da
existência.
Atitude vil, Julgadores, esta que se
firma em Direito para assinalar o ex-delituoso como animal réprobo,
besta sem porvir que, à semelhança do sino atado ao pescoço dos
leprosos, avisava que circulava ali um condenado, com a capacidade de
tingir de maldade pessoas de bem.
Indecorosa a disposição da Lei
10.826/2003; a despeito dos mais calorosos discursos em nome da
dignidade e do repúdio à sentença ad
eternum, almeja remar
contra o neopenalismo, e retomar tenebroso paradigma jurídico
antediluviano.
É o entendimento do TRF da 1ª
região:
ADMINISTRATIVO.
REGISTRO DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO DE
VIGILANTES. LEI 7.102/83.
CONDENAÇÃO CRIMINAL POR ESTUPRO. CUMPRIMENTO INTEGRAL DE PENA.
PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. ART. 64,
I,
DO CÓDIGO
PENAL.
ART. 5º,
XLVII,
B), DA CONSTITUIÇÃO.
RECURSO PROVIDO.
1. O art. 16, VI, da
Lei 7.102/93 exige para o exercício da profissão de vigilante não
ter antecedentes criminais registrados.
2. A condenação
do candidato a vigilante por dois estupros, com cumprimento da pena
há mais de seis anos, não representa empecilho ao registro do
certificado do curso. A uma, porque o efeito de uma condenação
penal desaparece depois de cinco anos do cumprimento da pena, nos
termos do art. 64,
I,
do Código
Penal.
A duas, porque a pena não pode gerar efeitos indefinidamente, pela
proibição de pena de caráter perpétuo, a teor da alínea b) do
inciso XLVII
do artigo 5º
da Constituição.(grifo
nosso).
3. Apelação provida
para determinar o registro do certificado do viligante.
TRF 1ª REGIÃO.AC
33643 DF 0033643-22.2007.4.01.3400. 5ª TURMA.
O ilustre Marquês de Beccaria, em sua mais
ilustre obra, já dissertava sobre a nocividade da pena extensiva,
que produziria maior efeito do que uma maior intensidade da sanção.
É o que ilegalmente se verifica na
atitude da União, ao discriminar para todo o sempre indivíduo que
apenas respondeu a processo penal não qual sequer foi condenado.
O que se olvida, nas salas e câmaras
acadêmicas, é que a atividade jurisdicional deve, a par de tudo,
ser examinada primariamente sob o prisma da Justiça.
Ainda que houvesse sido condenado,
infere-se do Código Penal que, após período quinquenal, restaria
solvida a questão de reincidência.
Não tendo sido condenado em processo
que compareceu em juízo, não há sequer como se falar em
ex-condenação, maiores motivos para, no caso em tela, não haver
possibilidade limitativa à atividade de vigilância.
O estabelecimento de limitação à
livre atividade de qualquer trabalho (art. 5°, CF/88, inciso XIII),
atitude que se vislumbra na Lei 10.826/2003 e Decreto n. 5123/2004,
opõe-se à ordem constitucional e não corresponde aos paradigmas
atuais de dignidade
e igualdade.
A tentativa ilegítima de criar signo
de intermitente periculosidade, desclassificando perpetuamente a
honra objetiva do autor no cerne social consiste em afronta ao
equilíbrio fraterno no locus
civilis, frontal moléstia
ao mútuo apoio e respeito que se espera preservado no ambiente
social.
Tais leis infraconstitucionais, por
denegrirem a imagem idônea do autor e atinarem contra a fraternidade
e a solidariedade,
direitos constitucionais de quarta dimensão1,
além de acutilarem a isonomia, a presunção de inocência e a livre
atividade laboral, são frontalmente INCONSTITUCIONAIS,
fazendo-se nulas entre as partes que pelejam em juízo.
DA INAPLICABILIDADE DO ESTATUTO DO
DESARMAMENTO
A autoridade apelada não pode se
valer do art. 4º, I, da Lei 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento),
combinado com o art. 38 do Decreto 5.123/04 (Regulamento do Estatuto
do Desarmamento) para eventualmente fundamentar sua postura de
desautorizar a frequência do apelante ao curso de reciclagem de
vigilantes.
Primeiro, porque o art. 4º, I, da Lei
10.826/03 não se presta a regular o caso concreto, pois cuida de
disciplinar os requisitos para aquisição
de arma de fogo por particulares, o que não ocorre no caso do
vigilante, que recebe arma do empregador. Eis redação do
dispositivo: “Art. 4º
Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá,
além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes
requisitos: I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de
certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela
Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar
respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão
ser fornecidas por meios eletrônicos”.
Segundo, porque o art. 38 do Decreto
5.123/04 (literalmente: “A
autorização para o uso de arma de fogo expedida pela Polícia
Federal, em nome das empresas de segurança privada e de transporte
de valores, será precedida, necessariamente, da comprovação do
preenchimento de todos os requisitos constantes do art. 4o da Lei no
10.826, de 2003, pelos empregados autorizados a portar arma de
fogo”), ao invocar os
requisitos do art. 4º da Lei 10.826/03, extrapola
o âmbito meramente regulamentar
(já que o precitado art. 4º não se presta a regular a “autorização
para o uso de arma de fogo expedida pela Polícia Federal, em nome
das empresas de segurança privada”),
incorrendo em ilegalidade.
Terceiro, porque não
é aplicável à espécie o art. art. 4º, I, da Lei 10.826/03, mas
sim o art. 16 da Lei 7.102/16, que é lei especial em relação ao
Estatuto do Desarmamento.
Mas, ainda que se entenda aplicável o art. art. 4º, I, da Lei
10.826/03, não há como se escapar da declaração de
inconstitucionalidade incidental desse dispositivo, de forma parcial
e com redução de texto (a fim de extirpar a expressão “e
de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo
criminal”), na medida do
quanto já explicitado, por violar o princípio constitucional da
presunção de inocência.
Por todo o exposto, verifica-se o
direito líquido e certo do autor tem ter acesso ao certificado de
conclusão do curso de vigilante, no qual foi aprovado.
Dessa forma, afigura-se imprescindível
a intervenção do Poder Judiciário, a fim de impedir a
concretização de ato ilegítimo, abusivo e inconstitucional,
consubstanciado na negativa do registro do certificado de vigilante
ao Autor.
Ademais, é sabido que a condenação
criminal não pode ter efeitos perpétuos sobre a pessoa do apenado,
mesmo ainda para impedi-lo de exercer a profissão, sob pena de
ofensa aos princípios constitucionais da razoabilidade e da
dignidade da pessoa humana.
DA REINSERÇÃO SOCIAL
O sistema jurídico brasileiro já há
muito superou o paradigma puramente retributivo do âmbito criminal.
Os ideais de prevenção e reinserção social, ao longo dos séculos,
vieram abrandar o aspecto vingativo do Direito Penal anterior a fim
de ajustá-lo, mais harmonicamente, aos novos horizontes abarcados
pelo Estado Democrático de Direito.
A vendeta pública, portanto, cedeu
espaço a maior humanização punitiva, que inclui, dentre múltiplos
aspectos, o respeito à dignidade do indivíduo que meramente se viu
submetido a inquérito policial ou a processo criminal ou, ainda,
daquele condenado ao cárcere.
A ressocialização do ex-detento ou,
como no caso em testilha, daquele que meramente respondeu a processo
criminal, vem no intuito de dignificar e resgatar a autoestima do
indivíduo que, tendo delinquido uma vez, não se vê necessariamente
propenso a cometer novo crime.
Cobra relevo o absurdo: as disposições
legais balizadoras da sentença, ao limitar o autor a obter diploma
do curso de vigilância, afirmam que ao ex-delinquente é negado o
direito de, no seio social, ter confiado a si trabalho lícito, pois
restaria inidôneo, imoral e, em sua vileza inata, ameaçaria a paz
social.
Parece-nos que, por tal atitude, o
Poder Público quase almeja a reincidência.
Há no senso de justiça comum
infernal tendência a, por meio de supressão da dignidade do ex-
delinquente, rebaixá-lo às vielas e alcovas mais nauseabundas,
tolhendo-o, por conta do passado, à perspectiva de ser com
plenitude.
Não esperamos, Doutores, que se faça
réplica da justiça social costumeira, sob o risco de, como nos
sensos comuns populares, cometer-se visível injustiça.
Posto isto, há que se respeitar as
prerrogativas da Carta Maior acima de qualquer norma
infraconstitucional, essencialmente quando se vislumbra tentativa de
punição perpétua, impedindo-se o autor de reinserir-se na sociedade.
IV - DOS PEDIDOS
Ante
o exposto, a
parte apelante pugna pela concessão
monocrática da antecipação da pretensão recursal, pelo
conhecimento e provimento do presente recurso para que seja reformada a sentença, julgando procedentes
todos os pedidos formulados na inicial, como medida de JUSTIÇA!
Nestes termos,
Pede e espera deferimento.
Brasília, 08 de maio de 2013.
ALEXANDRE
MENDES LIMA DE OLIVEIRA
Defensor Público Federal
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EMENTA
ADMINISTRATIVO. REGISTRO DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO DE VIGILANTES. NEGATIVA EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO CRIMINAL PELO CRIME DE FURTO TENTADO. ART. 64, I, DO CÓDIGO PENAL E ART. 5º, XLVII, “B’, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE.
I - Não obstante se reconheça a legitimidade da exigência de idoneidade moral para o exercício profissional de vigilante, eventual condenação penal pelo crime de furto tentando, não tem o condão, por si só, de configurar a ausência daquele requisito, mormente em se tratando de hipótese, como no caso, em que o autor teve a sua pena declarada extinta desde 1996.
II – Ademais, considerando, ainda, que o art. 64, inciso I, do Código Penal estabelece que o efeito da condenação penal desaparece depois de transcorrido cinco anos do cumprimento da pena, bem assim, que a Constituição Federal veda a pena de caráter perpétuo (CF, art. 5º, inciso XLVII, alínea “b”), afigura-se juridicamente possível, no caso, o registro do Certificado de Formação de Vigilante em nome do autor, desde que cumpridos os demais requisitos legais.
III - A antecipação da tutela poderá ser concedida, liminar ou incidentalmente, nos termos dos arts. 273, caput, e respectivos §§ 6º e 7º, c/c o art. 461, § 3º do CPC, e revogada ou modificada a qualquer tempo, afigurando-se legítimo o seu deferimento, quando presentes os requisitos legais para a sua concessão, como no caso.
IV – Apelação do autor provida.
ACÓRDÃO
Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor. Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Em 21/05/2014.
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE
(RELATOR):
Cuida-se de recurso de apelação interposto contra sentença proferida pelo douto juízo da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, que, nos autos ajuizados por XXX contra a União Federal, julgou improcedente o pedido, onde se objetiva a declaração de nulidade do ato administrativo que indeferiu o registro do Certificado do Curso de Formação de Vigilante efetivado pelo autor, independentemente da existência de condenação criminal anterior pela prática do crime de furto tentado.
Em suas razões recursais, o autor sustenta, em resumo que “se a Lei nº 7.102/1983 exige apenas certidão de antecedentes criminais, na qual pode constar eventual condenação criminal já transitada em julgado com punibilidade não extinta, em respeito ao princípio da inocência, não pode o Diretor Geral da Polícia Federal, usando seu poder regulamentar, aumentar as exigências para exercício profissional do impetrante. Ademais, ainda que lei houvesse vedando a expedição do certificado por conta de condenação penal com punibilidade extinta, tal lei seria obviamente inconstitucional por violação ao princípio da presunção de não culpabilidade, previsto no art. 5º, LVIII, da CF. Ademais, é sabido que a condenação criminal não pode ter efeitos perpétuos sobre a pessoa do apenado, mesmo ainda para impedi-lo de exercer a profissão, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana”. Por fim, argumenta a inaplicabilidade do Estatuto do Desarmamento na espécie dos autos.
Apresentadas contrarrazões, subiram os autos a este egrégio Tribunal.
Este é o relatório.
(RELATOR):
I
Na hipótese dos autos, o autor foi condenado pelo crime de furto tentado, sendo a sua pena declarada extinta em 06/11/1996. Com efeito, nos termos do art. 64, I, do Código Penal “não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação.”
Deste modo, considerando que o aludido dispositivo legal estabelece que o efeito da condenação penal desaparece depois de transcorridos cinco anos do cumprimento da pena, bem assim, que a Constituição Federal veda a pena de caráter perpétuo (CF, art. 5º, inciso XLVII, alínea “b”), afigura-se juridicamente possível, no caso, o registro do Certificado de Formação de Vigilante em nome do autor, desde que cumpridos os demais requisitos legais.
Nessa linha de entendimento, confiram-se, dentre outros, os seguintes julgados desta Corte Regional, in verbis:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. REGISTRO DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO/RECICLAGEM DE VIGILANTES. NEGATIVA EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO CRIMINAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO CUMPRIMENTO DA PENA, PELO CRIME DE LESÃO CORPORAL. ART. 64, I, DO CÓDIGO PENAL E ART. 5º, XLVII, "B', DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE.
I - Não obstante se reconheça a legitimidade da exigência de idoneidade moral para o exercício profissional de vigilante, não mais subsistindo os efeitos da condenação penal imposta ao suplicante, em razão da extinção da punibilidade pelo cumprimento da pena, como no caso, afigura-se indevida a negativa de registro do curso de formação ou reciclagem por ele realizado, sem prejuízo do cumprimento dos demais requisitos legais.
II - A antecipação da tutela poderá ser concedida, liminar ou incidentalmente, nos termos dos arts. 273, caput, e respectivos §§ 6º e 7º, c/c o art. 461, § 3º do CPC, e revogada ou modificada a qualquer
tempo, afigurando-se legítimo o seu deferimento, quando presentes os requisitos legais para a sua concessão, como no caso.
III - Agravo regimental desprovido. Decisão agravada mantida.
(AGAMS 0019962-14.2009.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.362 de 13/03/2014)
ADMINISTRATIVO. REGISTRO DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO DE VIGILANTES. LEI 7.102/83. CONDENAÇÃO CRIMINAL POR ESTUPRO. CUMPRIMENTO INTEGRAL DE PENA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. ART. 64, I, DO CÓDIGO PENAL. ART. 5º, XLVII, B), DA CONSTITUIÇÃO. RECURSO PROVIDO.
1. O art. 16, VI, da Lei 7.102/93 exige para o exercício da profissão de vigilante não ter antecedentes criminais registrados.
2. A condenação do candidato a vigilante por dois estupros, com cumprimento da pena há mais de seis anos, não representa empecilho ao registro do certificado do curso. A uma, porque o efeito de uma condenação penal desaparece depois de cinco anos do cumprimento da pena, nos termos do art. 64, I, do Código Penal. A duas, porque a pena não pode gerar efeitos indefinidamente, pela proibição de pena de caráter perpétuo, a teor da alínea b) do inciso XLVII do artigo 5º da Constituição.
3. Apelação provida para determinar o registro do certificado do vigilante.
(AC 0033643-22.2007.4.01.3400/DF, Rel. Desembargador Federal Fagundes De Deus, Conv. Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves (conv.), Quinta Turma,e-DJF1 p.103 de 18/02/2011)
Há de ver-se, ainda, que a Lei nº 7.102, de 20 de julho de 1983, que disciplina a atividade das empresas particulares que prestam serviços de vigilância e de transportes de valores, estipula, em seu art. 16, inciso VI, que o exercício da profissão de vigilante pressupõe a inexistência de antecedentes criminais registrados.
Por sua vez, a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, dispondo sobre o registro, a posse e a comercialização de armas de fogo e munição, estabelece, dentre outros requisitos, que a sua aquisição reclama a “comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos” (art. 4º, inciso I).
Vê-se, pois, que, para o exercício da profissão de vigilante, a exigência legal, dentre outras, é a de que não possua antecedentes criminais registrados (Lei nº 7.102/83, art. 16, VI). Por seu turno, para a aquisição de armas de fogo, exige a lei, além dos demais requisitos, a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais, fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral, e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal que poderão ser fornecidos por meios eletrônicos (Lei nº 10.826/2003, art. 4º, inciso I).
Portanto, existe um tratamento claramente diferente quanto aos requisitos exigidos para o exercício da profissão de vigilante, dentre os quais, exige-se, apenas, a comprovação de inexistência de antecedentes criminais, aí compreendidos, evidentemente, apenas aqueles precedidos de competente sentença penal condenatória transitada em julgado, nos termos do art. 5º, LVII, da Constituição Federal, enquanto que para aquisição de armas de fogo, além desses antecedentes criminais, deve o interessado comprovar que não responde a inquérito policial ou a processo criminal.
É bem verdade que o Decreto nº 5.123, de 1º de julho de 2004, ao regulamentar a referida Lei nº 10.826/2003, estabeleceu, em seu artigo 38, que “a autorização para o uso de arma de fogo expedida pela Polícia Federal, em nome das empresas de segurança privada e de transporte de valores, será precedida, necessariamente, da comprovação do preenchimento de todos os requisitos constantes do , pelos empregados autorizados a portar arma de fogo”.
Ocorre, porém, que a imposição em referência afigura-se manifestamente ilegal, na medida em que estabeleceu restrição não prevista em lei, violando, assim, o princípio da legalidade, insculpido no art. 5º, inciso II, da Constituição Federal.
II
Por fim, vejo presentes, na espécie, os pressupostos legais necessários à concessão da almejada antecipação da tutela, por força do que dispõe o art. 202 da Lei nº. 7.210/84, na dicção de que “cumprida ou extinta a pena, não constarão da folha corrida, atestados ou certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça, qualquer notícia ou referência à condenação, salvo para instruir processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos em lei” e, também, por se afinar com a orientação jurisprudencial já cristalizada no âmbito deste egrégio Tribunal e do colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, “para o registro de que se cuida, indispensável a ausência de antecedentes criminais. Contudo, a existência deles não pode constituir empeço à pretensão, quando, como no caso, o impetrante já cumpriu as penas que lhe foram impostas, estando, inclusive, arquivados os respectivos processos criminais. O indeferimento do pedido, nessa hipótese, significa perpetuar os efeitos da pena, o que é expressamente vedado pela Constituição” (AMS 0001789-10.2008.4.01.4100 / RO, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, SEXTA TURMA, e-DJF1 p.367 de 14/09/2009).
Nesse mesmo sentido, confira-se, dentre outros, o seguinte julgado:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. PENAL. HOMOLOGAÇÃO DE CERTIFICADO DE CURSO DE RECICLAGEM DE VIGILANTE. ANTECEDENTES CRIMINAIS. CUMPRIMENTO DA PENA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. 1. Os fatos ocorreram em 1999 e 2004. Tendo a pretensão punitiva sido extinta por cumprimento da pena, não seria razoável impor-se ao apelado os efeitos da condenação perpetuamente. 2. Apelação provida.
(AMS 0035136-97.2008.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL ALEXANDRE JORGE FONTES LARANJEIRA (EM SUBSTITUIÇÃO), QUINTA TURMA, e-DJF1 p.149 de 15/04/2011)
Presentes, pois, na espécie, os pressupostos legais necessários para a concessão da antecipação da tutela, que poderá ser concedida, liminar ou incidentalmente, nos termos dos arts. 273, caput, e respectivos §§ 6º e 7º, c/c o art. 461, § 3º do CPC, e revogada ou modificada a qualquer tempo, impõe-se a concessão da medida.
III
Com estas considerações, dou provimento à apelação do autor, deferindo, desde logo, o pedido de antecipação da tutela formulado, para determinar ao Departamento da Polícia Federal que proceda, de logo, ao registro do certificado do curso de formação da profissão de vigilante realizado pelo recorrente, sem prejuízo do preenchimento dos demais requisitos legais.
Oficie-se ao Sr. Diretor-Geral do Departamento da Polícia Federal, para cumprimento desse Acórdão mandamental, no prazo de 05 (cinco) dias, a contar da ciência deste decisum, sob pena de multa coercitiva no montante de R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de atraso, sem prejuízo das sanções previstas no parágrafo único do artigo 14, inciso V, do CPC.
Este é meu voto.
Apresentadas contrarrazões, subiram os autos a este egrégio Tribunal.
Este é o relatório.
VOTO
SOUZA PRUDENTE(RELATOR):
I
Na hipótese dos autos, o autor foi condenado pelo crime de furto tentado, sendo a sua pena declarada extinta em 06/11/1996. Com efeito, nos termos do art. 64, I, do Código Penal “não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação.”
Deste modo, considerando que o aludido dispositivo legal estabelece que o efeito da condenação penal desaparece depois de transcorridos cinco anos do cumprimento da pena, bem assim, que a Constituição Federal veda a pena de caráter perpétuo (CF, art. 5º, inciso XLVII, alínea “b”), afigura-se juridicamente possível, no caso, o registro do Certificado de Formação de Vigilante em nome do autor, desde que cumpridos os demais requisitos legais.
Nessa linha de entendimento, confiram-se, dentre outros, os seguintes julgados desta Corte Regional, in verbis:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. REGISTRO DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO/RECICLAGEM DE VIGILANTES. NEGATIVA EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO CRIMINAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO CUMPRIMENTO DA PENA, PELO CRIME DE LESÃO CORPORAL. ART. 64, I, DO CÓDIGO PENAL E ART. 5º, XLVII, "B', DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE.
I - Não obstante se reconheça a legitimidade da exigência de idoneidade moral para o exercício profissional de vigilante, não mais subsistindo os efeitos da condenação penal imposta ao suplicante, em razão da extinção da punibilidade pelo cumprimento da pena, como no caso, afigura-se indevida a negativa de registro do curso de formação ou reciclagem por ele realizado, sem prejuízo do cumprimento dos demais requisitos legais.
II - A antecipação da tutela poderá ser concedida, liminar ou incidentalmente, nos termos dos arts. 273, caput, e respectivos §§ 6º e 7º, c/c o art. 461, § 3º do CPC, e revogada ou modificada a qualquer
tempo, afigurando-se legítimo o seu deferimento, quando presentes os requisitos legais para a sua concessão, como no caso.
III - Agravo regimental desprovido. Decisão agravada mantida.
(AGAMS 0019962-14.2009.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.362 de 13/03/2014)
ADMINISTRATIVO. REGISTRO DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE FORMAÇÃO DE VIGILANTES. LEI 7.102/83. CONDENAÇÃO CRIMINAL POR ESTUPRO. CUMPRIMENTO INTEGRAL DE PENA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. ART. 64, I, DO CÓDIGO PENAL. ART. 5º, XLVII, B), DA CONSTITUIÇÃO. RECURSO PROVIDO.
1. O art. 16, VI, da Lei 7.102/93 exige para o exercício da profissão de vigilante não ter antecedentes criminais registrados.
2. A condenação do candidato a vigilante por dois estupros, com cumprimento da pena há mais de seis anos, não representa empecilho ao registro do certificado do curso. A uma, porque o efeito de uma condenação penal desaparece depois de cinco anos do cumprimento da pena, nos termos do art. 64, I, do Código Penal. A duas, porque a pena não pode gerar efeitos indefinidamente, pela proibição de pena de caráter perpétuo, a teor da alínea b) do inciso XLVII do artigo 5º da Constituição.
3. Apelação provida para determinar o registro do certificado do vigilante.
(AC 0033643-22.2007.4.01.3400/DF, Rel. Desembargador Federal Fagundes De Deus, Conv. Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves (conv.), Quinta Turma,e-DJF1 p.103 de 18/02/2011)
Há de ver-se, ainda, que a Lei nº 7.102, de 20 de julho de 1983, que disciplina a atividade das empresas particulares que prestam serviços de vigilância e de transportes de valores, estipula, em seu art. 16, inciso VI, que o exercício da profissão de vigilante pressupõe a inexistência de antecedentes criminais registrados.
Por sua vez, a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, dispondo sobre o registro, a posse e a comercialização de armas de fogo e munição, estabelece, dentre outros requisitos, que a sua aquisição reclama a “comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos” (art. 4º, inciso I).
Vê-se, pois, que, para o exercício da profissão de vigilante, a exigência legal, dentre outras, é a de que não possua antecedentes criminais registrados (Lei nº 7.102/83, art. 16, VI). Por seu turno, para a aquisição de armas de fogo, exige a lei, além dos demais requisitos, a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais, fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral, e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal que poderão ser fornecidos por meios eletrônicos (Lei nº 10.826/2003, art. 4º, inciso I).
Portanto, existe um tratamento claramente diferente quanto aos requisitos exigidos para o exercício da profissão de vigilante, dentre os quais, exige-se, apenas, a comprovação de inexistência de antecedentes criminais, aí compreendidos, evidentemente, apenas aqueles precedidos de competente sentença penal condenatória transitada em julgado, nos termos do art. 5º, LVII, da Constituição Federal, enquanto que para aquisição de armas de fogo, além desses antecedentes criminais, deve o interessado comprovar que não responde a inquérito policial ou a processo criminal.
É bem verdade que o Decreto nº 5.123, de 1º de julho de 2004, ao regulamentar a referida Lei nº 10.826/2003, estabeleceu, em seu artigo 38, que “a autorização para o uso de arma de fogo expedida pela Polícia Federal, em nome das empresas de segurança privada e de transporte de valores, será precedida, necessariamente, da comprovação do preenchimento de todos os requisitos constantes do , pelos empregados autorizados a portar arma de fogo”.
Ocorre, porém, que a imposição em referência afigura-se manifestamente ilegal, na medida em que estabeleceu restrição não prevista em lei, violando, assim, o princípio da legalidade, insculpido no art. 5º, inciso II, da Constituição Federal.
II
Por fim, vejo presentes, na espécie, os pressupostos legais necessários à concessão da almejada antecipação da tutela, por força do que dispõe o art. 202 da Lei nº. 7.210/84, na dicção de que “cumprida ou extinta a pena, não constarão da folha corrida, atestados ou certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça, qualquer notícia ou referência à condenação, salvo para instruir processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos em lei” e, também, por se afinar com a orientação jurisprudencial já cristalizada no âmbito deste egrégio Tribunal e do colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, “para o registro de que se cuida, indispensável a ausência de antecedentes criminais. Contudo, a existência deles não pode constituir empeço à pretensão, quando, como no caso, o impetrante já cumpriu as penas que lhe foram impostas, estando, inclusive, arquivados os respectivos processos criminais. O indeferimento do pedido, nessa hipótese, significa perpetuar os efeitos da pena, o que é expressamente vedado pela Constituição” (AMS 0001789-10.2008.4.01.4100 / RO, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, SEXTA TURMA, e-DJF1 p.367 de 14/09/2009).
Nesse mesmo sentido, confira-se, dentre outros, o seguinte julgado:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. PENAL. HOMOLOGAÇÃO DE CERTIFICADO DE CURSO DE RECICLAGEM DE VIGILANTE. ANTECEDENTES CRIMINAIS. CUMPRIMENTO DA PENA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. 1. Os fatos ocorreram em 1999 e 2004. Tendo a pretensão punitiva sido extinta por cumprimento da pena, não seria razoável impor-se ao apelado os efeitos da condenação perpetuamente. 2. Apelação provida.
(AMS 0035136-97.2008.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL ALEXANDRE JORGE FONTES LARANJEIRA (EM SUBSTITUIÇÃO), QUINTA TURMA, e-DJF1 p.149 de 15/04/2011)
Presentes, pois, na espécie, os pressupostos legais necessários para a concessão da antecipação da tutela, que poderá ser concedida, liminar ou incidentalmente, nos termos dos arts. 273, caput, e respectivos §§ 6º e 7º, c/c o art. 461, § 3º do CPC, e revogada ou modificada a qualquer tempo, impõe-se a concessão da medida.
III
Com estas considerações, dou provimento à apelação do autor, deferindo, desde logo, o pedido de antecipação da tutela formulado, para determinar ao Departamento da Polícia Federal que proceda, de logo, ao registro do certificado do curso de formação da profissão de vigilante realizado pelo recorrente, sem prejuízo do preenchimento dos demais requisitos legais.
Oficie-se ao Sr. Diretor-Geral do Departamento da Polícia Federal, para cumprimento desse Acórdão mandamental, no prazo de 05 (cinco) dias, a contar da ciência deste decisum, sob pena de multa coercitiva no montante de R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de atraso, sem prejuízo das sanções previstas no parágrafo único do artigo 14, inciso V, do CPC.
Este é meu voto.

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