Excelentíssimo Senhor
Ministro GILMAR MENDES
Presidente do Supremo
Tribunal Federal
Brasília-DF
MANDADO
DE INJUNÇÃO COLETIVO
(Assunto:
Servidor Público – Aposentadoria Especial – Mora legislativa)
O
SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES FEDERAIS AUTÁRQUICOS NOS ENTES DE
FORMULAÇÃO, PROMOÇÃO E FISCALIZAÇÃO DA POLÍTICA DA MOEDA E DO
CRÉDITO – SINAL,
entidade sindical regularmente constituída, inscrita no CNPJ sob o
nº 61.053.070/0001-00, com sede no SCS, Quadra 1, Bloco G, Edifício
Baracat, Sala 401, Asa Sul, Brasília, DF, atuando
como substituto processual de seus filiados, vem
à presença de Vossa Excelência, por seus procuradores signatários,
que recebem intimações no Setor Bancário Norte (SBN), Quadra 02,
Bloco J, Ed. Engenheiro Paulo Maurício, Salas 809/813, Telefones
(61) 3327-0934 e 3326-0554, Brasília-DF, com suporte nos artigos 5º,
LXXI, e 8º, III, da Constituição da República, impetrar MANDADO
DE INJUNÇÃO COLETIVO
em face da omissão do Excelentíssimo Senhor PRESIDENTE
DA REPÚBLICA, conforme
segue:
1.
DO OBJETO E DO INTERESSE DE AGIR
O
Impetrante é entidade sindical de base, de nível nacional, que
congrega os servidores públicos federais autárquicos pertencentes
aos quadros do Banco Central
do Brasil - BACEN, regidos
pela Lei nº 8.112, de 1990, e pretende, através do presente Mandado
de Injunção, obter pronunciamento mandamental que assegure a
obtenção de aposentadoria especial aos servidores processualmente
substituídos “cujas atividades sejam exercidas sob condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física”
(artigo 40 § 4º, III, da Constituição Federal1),
ante a omissão legislativa em editar a Lei Complementar para
regulamentar o exercício do direito.
A
omissão denunciada deriva da mora do Excelentíssimo Senhor
Presidente da República, vez que, nos termos do disposto no artigo
61, § 1°, II, c, da Constituição Federal, detém ele iniciativa
privativa para a deflagração de processo legislativo que trate da
aposentadoria dos servidores públicos da União, como se vê:
“Art.
61 A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer
membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do
Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal
Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República
e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
§
1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as
leis que: (…)
II
- disponham sobre:
(…)
c)
servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico,
provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;
(…)”
O
interesse de agir exsurge a partir da jurisprudência da Suprema
Corte, que, em controle difuso, é rigorosa ao afirmar a
impossibilidade de concessão da aposentadoria especial, porque
ausente lei regulamentadora da matéria.2
Nesse sentido vale observar que diversos servidores do Banco Central
do Brasil - BACEN têm atribuições que envolvem atividades
perigosas ou insalubres (artigo 68 da Lei nº 8.112, de 19903),
porque permanentemente sujeitos a riscos à integridade física ou a
agentes nocivos à saúde,4
exercendo atividades abrangidas pelo disposto no artigo 40, § 4º,
III, da Constituição Federal, o que ensejaria a obtenção de
aposentadoria especial.
Como
exemplo atividades perigosas registra-se os servidores que exerceram,
até a data da vigência da Portaria 196/1989, o cargo de vigilante
e, após essa data aqueles que se mantiveram na atividade, com porte
de armas. Há, também, servidores que exercem atividades perigosas
ligadas a transporte de valores, expostos permanentemente a situações
de risco.
A
insalubridade, por sua vez, atinge, entre outros, os servidores
lotados no Meio Circulante – MECIR
conforme já restou
comprovado em Laudo de Avaliação Ambiental elaborado por Médico do
Trabalho, após perícia realizada nas dependências do Departamento
do Meio Circulante do BACEN das cidades de Belém, Belo Horizonte,
Brasília, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro,
Salvador e São Paulo quando restaram bem definidos os riscos da
atividade em face dos fatores ‘ruído’ e ‘poeira’.
Por
isso, é cabível a pretensão, pois a impetração tem suporte
constitucional, no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição
Federal que assim dispõe:
“Art.
5º (…)
(...)
LXXI
- conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania; (…)”
Com
efeito, é competente o E. Supremo Tribunal Federal para conhecer e
julgar este Mandado de Injunção, porque o ato omissivo deriva de
autoridade ou órgão submetido à jurisdição dessa Corte, ex
vi do artigo 102, I, q,
da Constituição Federal.5
2.
DA LEGITIMIDADE
Trata-se
da defesa de interesse ou direito coletivo6
da categoria representada pela entidade sindical ou, pelo menos, de
interesse ou direito de parte da categoria;7
senão, de direitos individuais homogêneos dos servidores
interessados, porque “decorrentes de origem comum”,8
hipóteses que, indistintamente, alcançam legitimidade ativa
extraordinária ao sindicato, porquanto pleiteia, em nome próprio,
direito alheio, assim autorizado no artigo 6º, do Código de
Processo Civil, quando afirma que “Ninguém
poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo
quando autorizado por lei.”
A
exigida autorização legislada vem da Constituição Federal, cujo
artigo 8º, III, atribui aos sindicatos “a defesa dos direitos e
interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em
questões judiciais ou administrativas”, tal que o Supremo Tribunal
Federal já decidiu que “os sindicatos têm legitimidade processual
para atuar na defesa de todos e quaisquer direitos subjetivos
individuais e coletivos dos integrantes da categoria por ele
representada”.9
Logo,
o sindicato é parte legitima para impetrar Mandado de Injunção
Coletivo, também porque a “jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal firmou-se no sentido de admitir a utilização, pelos
organismos sindicais e pelas entidades de classe, do mandado de
injunção coletivo, com a finalidade de viabilizar, em favor dos
membros ou associados dessas instituições, o exercício de direitos
assegurados pela Constituição”.10
Cumpre
consignar que, para propor esta ação, do sindicato é inexigível a
obtenção de expressa autorização dos servidores sindicalizados,
bem como inexigível a apresentação da relação nominal daqueles
processualmente substituídos, conforme assegura a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, como se
vê:
“CONSTITUCIONAL.
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. SUBSTITUIÇÃO
PROCESSUAL. AUTORIZAÇÃO EXPRESSA. OBJETO A SER PROTEGIDO PELA
SEGURANÇA COLETIVA. C.F., art. 5º, LXX, "b".
I.
- A legitimação das organizações sindicais, entidades de classe
ou associações, para a segurança coletiva, é extraordinária,
ocorrendo, em tal caso, substituição processual. C.F., art. 5º,
LXX.
II.
- Não se exige, tratando-se de segurança coletiva, a autorização
expressa aludida no inciso XXI do art. 5º da Constituição, que
contempla hipótese de representação.
III.
- O objeto do mandado de segurança coletivo será um direito dos
associados, independentemente de guardar vínculo com os fins
próprios da entidade impetrante do writ, exigindo-se, entretanto,
que o direito esteja compreendido na titularidade dos associados e
que exista ele em razão das atividades exercidas pelos associados,
mas não se exigindo que o direito seja peculiar, próprio, da
classe.
IV.
- R.E. conhecido e provido.”11
“O
artigo 8º, III, da Constituição não exige que a entidade sindical
obtenha autorização dos sindicalizados para a atuação judicial ou
administrativa, porquanto se trata de substituição
processual,
diferentemente do que ocorre com a legitimidade mediante
representação
atribuída às associações não-sindicais. O artigo 8º, III, da
Constituição estabeleceu um poder-dever aos sindicatos, pois os
autoriza a atuação em defesa dos direitos e interesses da categoria
e, ao mesmo tempo, impõe-lhes o dever de defendê-los (também por
conta do princípio da unicidade
sindical;
artigo 8º, II, da Constituição). Diferente é o artigo 5º, XXI,
da Constituição, que, ao atribuir legitimidade para as associações
não-sindicais representar seus filiados, exige expressa autorização
deles. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça: “(...) 3
- A Lei nº 8.073/90 (art. 3º), em consonância com as normas
constitucionais (art. 5º, incisos XXI e LXX, CF/88), autorizam os
sindicatos a representarem seus filiados em juízo, quer nas ações
ordinárias, quer nas seguranças coletivas, ocorrendo a chamada
substituição processual. Desnecessária, desta forma, autorização
expressa ou a relação nominal dos substituídos (cf. STF, Ag Reg RE
225.965/DF e STJ, RMS nº 11.055/GO e REsp. nº 72.028/RJ)”12
Do
exposto se extrai que as decisões obtidas nesta ação favorecem
todos aqueles que, independente de estarem relacionados, se
encontrarem na situação fático-jurídica a seguir relatada.13
3.
DO DIREITO
3.1.
Das disposições constitucionais
A
Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional
nº 47/2005 prevê, no artigo 201, a aposentadoria especial para os
segurados do Regime Geral de Previdência Social:
“Art.
201 (…)
§
1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados
para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral
de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas
sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência,
nos termos definidos em lei complementar.”
Na
redação anterior (Emenda Constitucional nº 20/1998) já havia
regra semelhante, como se constata:
“Art. 201 (…)
§ 1º É vedada a adoção
de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de
aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência
social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidos em lei complementar.”
A
diferença entre as disposições está em que a Emenda 47 estendeu a
possibilidade de aposentadoria especial para a hipótese de “se
tratar de segurados portadores de deficiência”, caso inexistente
no texto da Emenda Constitucional nº 20.14
Para
os servidores públicos titulares de cargos efetivos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas
autarquias e fundações, o tratamento constitucional da questão
está disposto no § 4º do artigo 40, também na redação dada pela
Emenda Constitucional 47, de 2005:
“Art. 40 (…)
(...)
§ 4º É vedada a adoção
de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de
aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo,
ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de
servidores:
I – portadores de
deficiência;
II – que exerçam
atividades de risco;
III – cujas atividades
sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou
a integridade física.”
Também
neste caso, a redação dada a esse dispositivo pela Emenda
Constitucional nº 20/1998, já disciplinava a questão:15
“Art. 40 (…)
(...)
§ 4º É vedada a
adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão
de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo,
ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob
condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, definidos em lei complementar.”
Assim,
para os servidores públicos, a diferença está em que, atualmente,
a Constituição Federal permite critérios diferenciados de
aposentadoria também aos “portadores de deficiência” e àqueles
que “exerçam atividades de risco”, além do que já constava
para atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a
saúde ou a integridade física.
No
último caso antes constava que as atividades deveriam ser exercidas
“exclusivamente” sob condições especiais, o que foi suprimido
pela Emenda Constitucional nº 47/2005.
Pode-se
dizer que as regras constitucionais atuais vedam a adoção de
requisitos e critérios diferenciados para a concessão de
aposentadoria, o que suporta as seguintes exceções, nas quais se
permite a aposentadoria dita especial:
- para os segurados do regime geral de previdência social: (a) nas atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e (b) aos portadores de deficiência;
- para servidores públicos: (a) nas atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, (b) aos portadores de deficiência e (c) aos que exerçam atividades de risco.
Em
todos os casos a regulamentação da matéria deve ser definida em
Lei Complementar, forma com a qual o legislador constitucional
qualificou a possibilidade de se estabelecer os requisitos e
critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria.
3.2.
Das disposições infraconstitucionais
3.2.1.
Dos segurados do Regime Geral de Previdência Social
A
Lei nº 8.213/1991 dispõe sobre a aposentadoria especial para os
beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, nos termos dos
artigos 57 e 58. É assim por força do disposto no artigo 15 da
Emenda Constitucional n° 20/1998, que assegura a aplicabilidade
desses dispositivos, até a publicação da exigida Lei Complementar,
o que não ainda não ocorreu.
“Art. 15 - Até que a
lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição
Federal, seja publicada, permanece em vigor o disposto nos arts. 57 e
58 da Lei nº 8213, de 24 de julho de 1991, na redação vigente à
data da publicação desta Emenda.”
A
partir da Lei nº 9.032/1995, que alterou a Lei nº 8.213, houve
significativa mudança na concessão da aposentadoria especial, não
mais sendo concedida em função do exercício de atividade
profissional que prejudique a saúde ou a integridade física.
Conforme
a atual redação do artigo 57 da Lei nº 8.213, a aposentadoria
especial aos segurados do Regime Geral de Previdência Social é
concedida ao empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual
(esta hipótese somente quando cooperado filiado à cooperativa de
trabalho ou de produção), que tenha trabalhado sujeito a condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante
quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme o caso. Verbis:
“Art.
57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a
carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito
a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos,
conforme dispuser a lei.
.§
1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta
Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento)
do salário-de-benefício.
§
2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a
da aposentadoria por idade, conforme o disposto no art. 49.
§
3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação
pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS,
do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em
condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, durante o período mínimo fixado.
§
4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho,
exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou
associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade
física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do
benefício.
§
5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam
ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade
física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de
trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios
estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social,
para efeito de concessão de qualquer benefício.
§
6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os
recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do
art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas
serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme
a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a
concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e
cinco anos de contribuição, respectivamente.
§
7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide
exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às
condições especiais referidas no caput.
§
8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos
deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação
que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no
art. 58 desta Lei.”
Portanto,
é assegurada aos beneficiários do Regime Geral de Previdência
Social a contagem especial do tempo de serviço para fins de
aposentadoria.
Com efeito, o benefício
passou a ser concedido em função (a) da comprovação de tempo de
trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e (b) da
efetiva exposição dos trabalhadores aos agentes nocivos químicos,
físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à
saúde, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do
benefício.
A
Lei nº 8.213/1991 determina que a relação dos agentes nocivos
químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes
prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para
fins de concessão da aposentadoria especial será definida pelo
Poder Executivo:
“Art. 58. A relação
dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação
de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física
considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que
trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.”
Assim,
o Anexo IV do Decreto nº 3.048/1999, ao regulamentar a Lei nº
8.213, estabeleceu a classificação dos agentes nocivos que
autorizam a aposentadoria especial e o correspondente período
exigido para a concessão do benefício:
“Art. 68. A
relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou
associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade
física, considerados para fins de concessão de aposentadoria
especial, consta do Anexo IV.”
A
definição de trabalho permanente também consta do Decreto
3.048/1999, nos seguintes termos:
“Art. 65. Considera-se
trabalho permanente, para efeito desta Subseção, aquele que é
exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a
exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao
agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço.”
A
comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos
será feita mediante formulário denominado perfil profissiográfico
previdenciário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do
Seguro Social, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em
laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por
médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, ex
vi do § 2º do artigo 68
do Decreto nº 3.048/1999.
“Art. 68 (…)
(...)
§ 2º A comprovação
da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita
mediante formulário denominado perfil profissiográfico
previdenciário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do
Seguro Social, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em
laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por
médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.”
Para
o segurado do Regime Geral de Previdência Social que houver
exercido, sucessivamente, duas ou mais atividades sujeitas a
condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade
física, sem completar em qualquer delas o prazo mínimo exigido para
a aposentadoria especial, os
respectivos períodos serão somados após conversão,
conforme a seguinte tabela, considerada a atividade preponderante
(artigo 66 do Decreto 3.048, de 1999):
Tempo a
converter
|
Multiplicadores
|
||
Para 15 anos
|
Para 20 anos
|
Para 25 anos
|
|
De 15 anos
|
-
|
1,33
|
1,67
|
De 20 anos
|
0,75
|
-
|
1,25
|
De 25 anos
|
0,6
|
0,8
|
-
|
Já a conversão de
tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela, prevista no artigo
70 do Decreto nº 3.048:
Tempo a
converter
|
Multiplicadores
|
|
Mulher (para 30)
|
Homem (para 35)
|
|
De 15 anos
|
2,00
|
2,33
|
De 20 anos
|
1,50
|
1,75
|
De 25 anos
|
1,20
|
1,40
|
A última hipótese de
conversão acontece com suporte no § 5º do artigo 57 da Lei nº
8.213/1991, assim redigido:
“Art. 57 (…)
(...)
§ 5º O
tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou
venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade
física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de
trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios
estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social,
para efeito de concessão de qualquer benefício.”16
Percebe-se
que, favorecendo os beneficiários do Regime Geral da Previdência
Social, nos casos de atividades exercidas sob condições especiais
que prejudiquem a saúde ou a integridade física, há extensa
regulamentação de aposentadoria especial, o que constitui apenas a
primeira hipótese da ressalva do § 1º do artigo 201 da
Constituição Federal.
No
que diz respeito à aposentadoria especial de segurados do Regime
Geral Portadores de Deficiência – segunda hipótese da ressalva do
§ 1º do artigo 201 da Constituição Federal, criada pela Emenda
Constitucional 47/2005, ainda não há regulamentação.
3.2.2.
Dos servidores públicos
Ainda
que o § 4° do artigo 40 da Constituição Federal trate da
aposentadoria especial para o servidor público, não existe
regulamentação do assunto, diferentemente do que acontece para os
beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, para a
hipótese de atividades exercidas sob condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, como se demonstrou.
Não há, portanto,
possibilidade de contagem especial de serviço para fins de
aposentadoria aos servidores públicos, em nenhuma das hipóteses
constitucionais, quais sejam: (a) servidores portadores de
deficiência, (b) servidores que exerçam atividades de risco e
(c) servidores cujas atividades sejam exercidas sob condições
especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
Por
isso a presente impetração com vistas a obter pronunciamento
mandamental que assegure a aposentadoria especial àqueles servidores
processualmente substituídos “cujas atividades sejam exercidas sob
condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física” (artigo 40 § 4º, III, da Constituição Federal, porque
há omissão legislativa em editar a Lei Complementar para
regulamentar o exercício deste direito, a torná-lo inviável.
3.3.
Da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
Em
30 de agosto de 2007, o plenário do Excelso Supremo Tribunal Federal
julgou o Mandado de Injunção nº 721, relatado pelo Excelentíssimo
Ministro Marco Aurélio, oportunidade que acolheu pedido formulado
por servidora pública federal contra a Presidência da República17
para, de forma mandamental, adotar o sistema do Regime Geral de
Previdência Social (Lei nº 8.213/1991, artigo 57), assentando o
direito à aposentadoria especial de que trata o § 4º do artigo 40
da Constituição.
A Suprema Corte adotou a
corrente que admite a remoção da omissão legislativa pelo Poder
Judiciário, viabilizando o exercício do direito no caso concreto,
ao conferir à sua decisão natureza mandamental, não simplesmente
declaratória da inércia legislativa.
No
Mandado de Injunção nº 721 o Supremo Tribunal Federal asseverou
caber-lhe não apenas a declaração da omissão do poder incumbido
de regulamentar o direito, mas viabilizar, no caso concreto, o
exercício desse direito, afastando as conseqüências da inércia do
legislador.
A
decisão do Mandado de Injunção nº 721 restou assim resumida
(publicada em 30 de novembro de 2007):
“MANDADO
DE INJUNÇÃO - NATUREZA. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo
5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção
quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à
soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente
declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da
impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. MANDADO DE
INJUNÇÃO - DECISÃO - BALIZAS. Tratando-se de processo subjetivo, a
decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele
revelada. APOSENTADORIA - TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS -
PREJUÍZO À SAÚDE DO SERVIDOR - INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR -
ARTIGO 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Inexistente a
disciplina específica da aposentadoria especial do servidor,
impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria
aos trabalhadores em geral - artigo 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91.”
O
direito dos servidores públicos à obtenção de aposentadoria
especial, anunciado na Constituição Federal desde 1988, não pode
ser resolvido sem a intromissão concreta do Supremo Tribunal
Federal, porque a norma faltante é constitutiva para o exercício do
direito, cuja ausência impede toda e qualquer manifestação dele.
Sem a norma, emanada do Congresso ou declarada pelo Supremo, é
impossível a obtenção da aposentadoria especial aos servidores
públicos, embora diga respeito a direito constitucionalmente
assegurado.
Para
bem perceber a importância do Mandado de Injunção nº 721 – o
que, de outro lado, evidencia o interesse de agir, a obter a regra
faltante mediante esta impetração –, cumpre lembrar que a
jurisprudência da Suprema Corte, em controle difuso, é
absolutamente rigorosa quanto à impossibilidade de concessão da
aposentadoria especial, porque faltante a lei regulamentadora da
matéria. Veja-se, por exemplo:
“O direito à contagem
especial do tempo de serviço prestado sob condições insalubres
pela servidora pública celetista, à época em que a legislação
então vigente permitia tal benesse, incorporou-se ao seu patrimônio
jurídico. Não obstante, para o período posterior ao advento da Lei
8.112/90, é necessária a regulamentação do art. 40, § 4º da
Carta Magna. Precedentes. Recurso extraordinário conhecido e
parcialmente provido.” (RE 382.352/SC, Ellen Gracie, Segunda Turma,
DJ 06/02/2004);
“1. Servidor público
federal: contagem especial de tempo de serviço prestado enquanto
celetista, antes, portanto, de sua transformação em estatutário:
direito adquirido, para todos os efeitos, desde que comprovado o
efetivo exercício de atividade considerada insalubre, perigosa ou
penosa. Com relação ao direito à contagem de tempo referente ao
período posterior à L. 8.112/90, firmou esta Corte entendimento no
sentido de que, para concessão de tal benefício, é necessária a
complementação legislativa de que trata o artigo 40, § 4º, da CF.
Precedentes. 2. Agravo Regimental provido, em parte, para,
alterando-se a parte dispositiva da decisão agravada, dar parcial
provimento ao extraordinário e reconhecer ao agravado o direito à
contagem especial do tempo de serviço prestado sob efetivas
condições insalubres no período anterior à L. 8.112/90.” (RE
367.314AgR/SC, Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ 14/05/2004).
Ainda
quanto à importância do Mandado de Injunção nº 721, sob o
aspecto da mudança de paradigma jurisprudencial, não se pode
esquecer que, até então, a Suprema Corte considerava que a ausência
de norma regulamentadora da aposentadoria especial não permitia a
concessão de Mandado de Injunção aos servidores públicos,
conforme constou do Mandado de Injunção nº 444, Ministro Sydney
Sanches, publicado em novembro de 1994, assim resumido:
“Aposentadoria
especial. Atividades insalubres. Artigos 5., inc. LXXI, e 40, par.
1., da Constituição Federal. 1. O par. 1. do art. 40 da C.F. apenas
faculta ao legislador, mediante lei complementar, estabelecer
exceções ao disposto no inciso III, ‘a’ e ‘c’, ou seja,
instituir outras hipóteses de aposentadoria especial, no caso de
exercício de atividades consideradas penosas, insalubres ou
perigosas. 2. Tratando-se de mera faculdade conferida ao legislador,
que ainda não a exercitou, não há direito constitucional já
criado, e cujo exercício esteja dependendo de norma regulamentadora.
3. Descabimento do Mandado de Injunção, por falta de possibilidade
jurídica do pedido, em face do disposto no inc. LXXI do art. 5. da
C.F., segundo o qual somente é de ser concedido mandado de injunção,
quando a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício
de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes a nacionalidade, a soberania e a cidadania. 4. Mandado de
Injunção não conhecido. Votação unânime.”
No mesmo sentido, os
seguintes julgados: MI 425/DF, Min. Sydney Sanches (DJ 11/11/1994);
MI 462/MG, Moreira Alves (DJ 24/11/1995); MI 446/RJ, Néri da
Silveira (DJ 04/04/1997); MI 484/RJ, Néri da Silveira (DJ
03/10/1997) e; MI 494/MT, Sydney Sanches (DJ 12/12/1997).
Agora,
no entanto, o cenário jurisprudencial é outro, conforme se
demonstrou, ensejando a procedência do pedido mandamental, para
reconhecer a falta de norma regulamentadora do direito à
aposentadoria especial dos servidores substituídos e remover o
obstáculo criado por essa omissão, para tornar viável o exercício
do direito que trata o artigo 40, § 4º, III, da Constituição
Federal.
3.4.
Das razões que autorizam o presente Mandado de Injunção com pedido
mandamental
Na
esteira de decisões do Excelso Supremo Tribunal Federal que têm
conferido efetiva eficácia às decisões proferidas em Mandados de
Injunção, conclui-se que, no caso específico da aposentadoria
especial, para os servidores que laboram em condições especiais que
prejudicam a saúde ou a integridade física, impõe-se o julgamento
de procedência do presente Mandado de Injunção, de forma
mandamental, eis que:
(a)
as alterações trazidas pela Emenda Constitucional nº 47/2005,
restaram superados os entendimentos anteriormente manifestados acerca
da matéria;
(b)
não pairam dúvidas sobre a existência da mora legislativa, e
(c)
incumbe ao STF garantir a efetividade de suas decisões, formulando
supletivamente a norma regulamentadora faltante para o caso, conforme
reconhecido no julgamento do MI 721-7/DF.
Se
sob a égide da redação original do texto constitucional (artigo
40, § 1°) entendia-se que o constituinte tratara de mera faculdade
de se estabelecer requisitos e critérios diferenciados para alcançar
a aposentadoria aos servidores que laboram em condições especiais,
com as alterações introduzidas pela Emenda Constitucional nº
20/1998, e pela Emenda Constitucional nº 47/2005, restou superada
qualquer dúvida sobre a existência desse direito, vez que o
constituinte não mais se utilizou do verbo “poder”, permanecendo
o exercício do direito, no entanto, obstado pela ausência de lei
complementar.
Em
razão disso, embora amparados pela Constituição Federal, há
vários anos, os servidores que laboram em condições especiais, que
prejudicam a saúde ou a integridade física, estão impedidos de
exercer o direito à aposentadoria especial, em razão da mora
legislativa, cuja ocorrência, na hipótese, é inquestionável.18
Para casos assim é que a
Constituição da República autorizou a concessão do mandado de
injunção, sempre que a ausência da norma regulamentadora torne
inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais
(artigo 5°, LXXI).
Por outro lado, a mera
declaração da mora legislativa e a conseqüente solicitação ao
Poder Legislativo para que cumpra seu dever, não tem o condão de
dar efetividade à garantia constitucional, de modo que a decisão
assim proferida acaba por ser ineficaz.
Atenta
a essa situação, é que esta Corte Constitucional tem questionado
sua própria atuação no julgamento dos mandados de injunção, como
se vê do voto proferido pelo Ministro Marco Aurélio, relator do MI
721:
“É tempo de se
refletir sobre a timidez inicial do Supremo quanto ao alcance do
mandado de injunção, ao excesso de zelo, tendo em vista a separação
e harmonia entre os Poderes. É tempo de se perceber a frustração
gerada pela postura inicial, transformando o mandado de injunção em
ação simplesmente declaratória do ato omissivo, resultando em algo
que não interessa, em si, no tocante à prestação jurisdicional,
tal como consta no inciso LXXI do artigo 5° da Constituição
Federal, ao cidadão. Impetra-se este mandado de injunção não para
lograr-se simples certidão de omissão do Poder incumbido de
regulamentar o direito a liberdades constitucionais, a prerrogativas
inerentes a nacionalidade, à soberania e à cidadania. Busca-se o
Judiciário na crença de lograr a supremacia da Lei Fundamental, a
prestação jurisdicional que afaste as nefastas conseqüências da
inércia do legislador.”
A
mesma preocupação é demonstrada pelo Ministro Eros Grau, em seu
voto, no mesmo mandado de injunção:
“8. Havendo, portanto,
sem qualquer dúvida, mora legislativa na regulamentação do
preceito veiculado pelo artigo 40, § 4°, a questão que se coloca é
a seguinte: presta-se, esta Corte, quando se trate da apreciação de
mandados de injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia?”
Prossegue o Ministro:
“9. Esta é a questão
fundamental a considerarmos. Já não se trata de saber se o texto
normativo de que se cuida – Artigo 40, § 4° - é dotado de
eficácia. Importa verificarmos é se o Supremo Tribunal Federal
emite decisões ineficazes; decisões que se bastam em solicitar ao
Poder Legislativo que cumpra o seu dever, inutilmente. Se é
admissível o entendimento segundo o qual, nas palavras do Ministro
Néri da Silveira, ‘a Suprema Corte do País decid[e] sem que seu
julgado tenha eficácia’. Ou, alternativamente, se o Supremo
Tribunal Federal deve emitir decisões que efetivamente surtam
efeito, no sentido de suprir aquela omissão.”
O
Ministro Carlos Britto, de igual modo, reconheceu a carga mandamental
que deve conter a decisão proferida em mandado de injunção, de
modo a garantir-lhe eficácia, observando:
“(…) nas discussões
anteriores, observei que somente cabe mandado de injunção perante
uma norma constitucional de eficácia limitada. Sendo assim, não faz
sentido proferir uma decisão judicial também de eficácia limitada.
É uma contradição nos termos. A decisão judicial há de ser
plenoperante, marcada pela sua carga de concretude, ou seja, tem de
ser mandamental, como é da natureza da ação constitucional agora
sob julgamento.”
As
discussões supra,
travadas nessa Corte, são de suma importância quando se trata do
direito à aposentadoria especial, visto que está em jogo a saúde e
a integridade física do servidor que labora em condições
prejudiciais à saúde e à integridade física.
Nesse diapasão, em razão
da mora legislativa, esses servidores são obrigados a permanecer,
durante muito mais tempo, expostos a essas condições prejudiciais,
o que acarreta danos irreversíveis a sua saúde.
Nessa
situação, não é só o direito à aposentadoria especial que resta
prejudicado, mas também um outro direito social fundamental que na
está na base do reconhecimento do direito ao estabelecimento de
regras e critérios diferenciados quando se trate de servidor
submetido a condições de trabalhos especiais: o direito à saúde
(Constituição Federal, artigo 6°).
O
princípio da isonomia (Constituição Federal, artigo 5°, caput),
de igual modo, constitui fundamento para o reconhecimento de um
direito à aposentadoria especial, na medida em que, mediante o
estabelecimento de requisitos e critérios diferenciados busca-se
igualar o trabalhador que labora em condições especiais ao
trabalhador que labora em condições normais. Trata-se, portanto, de
garantir uma igualdade real, e não meramente formal, a partir da
aplicação do princípio de que se deve tratar igualmente os iguais
e desigualmente os desiguais.
A previsão
constitucional, contudo, possui eficácia limitada, reclamando, para
o seu exercício a edição de lei complementar que até hoje não
foi editada.
O
artigo 5°, LXXI, da Constituição Federal, por seu turno, autoriza
o Supremo Tribunal Federal a, nessa hipótese, se verificada a mora
legislativa, estabelecer, para o caso concreto e até que se edite a
lei pertinente, os limites do exercício do direito
constitucionalmente garantido.
Tal autorização está
consubstanciada, ainda, no § 1°, do artigo 5°, que estabelece que
“as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm
aplicação imediata”.
Nesse
sentido, bem acentuou o Ministro Marco Aurélio, no julgamento do MI
721:
“Iniludivelmente,
buscou-se, com a inserção do mandado de injunção, no cenário
jurídico-constitucional, tornar concreta, tornar viva a Lei Maior,
presentes direitos, liberdades e prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania. Não se há de confundir
a atuação no julgamento do mandado de injunção com atividade do
Legislativo. Em síntese, ao agir, o Judiciário não lança, na
ordem jurídica, preceito abstrato. Não, o que se tem, em termos de
prestação jurisdicional, é a viabilização, no caso concreto, do
exercício do direito, do exercício da liberdade constitucional, das
prerrogativas ligadas a nacionalidade, soberania e cidadania.”
No
que se refere à finalidade do mandado de injunção, o
Excelentíssimo Ministro Eros Grau traz em seu voto esclarecedora
exposição do Professor José Ignácio Botelho de Mesquita, que diz:
“O mandado de injunção
‘[d]estina-se, apenas, à remoção do obstáculo criado pela
omissão do poder competente para a norma regulamentadora. A remoção
desse obstáculo se realiza mediante a formação supletiva da norma
regulamentadora faltante. É este o resultado prático que se pode
esperar do mandado de injunção.
(…)
O que cabe ao órgão da
jurisdição não é, pois constranger alguém a dar cumprimento ao
preceito constitucional, mas, sim, suprir a falta de norma
regulamentadora, criando, a partir daí, uma coação da mesma
natureza daquela que estaria contida na norma regulamentadora.”
Salienta
o Ministro Eros Grau que a formulação supletiva da norma
regulamentar faltante constitui um dever-poder do Judiciário, vez
que lhe cabe remover o obstáculo advindo da omissão legislativa.
Assim, de acordo com o
que foi exposto, se concedida a injunção no presente caso, deve
essa Corte definir a norma adequada à regulação da matéria, de
modo a viabilizar o exercício do direito à aposentadoria especial
aos servidores que laboram em condições especiais, até que seja
editada a lei complementar a que se refere o texto constitucional.
3.5.
Das regras a serem declaradas
A
Constituição Federal assegura a aposentadoria especial tanto para
os trabalhadores submetidos ao Regime Geral de Previdência, quanto
aos servidores públicos (artigos 201, § 1°, e 40, § 4°, da CF).
Em
ambos os casos, o direito ampara aqueles que laboram em condições
especiais, que prejudiquem a saúde e a integridade física e aos
portadores de deficiência. A única diferença está em que, no caso
dos servidores públicos, com as alterações introduzidas pela
Emenda Constitucional 47/2005, incluiu-se na previsão também os
servidores que exercem atividades com risco de vida. A eficácia do
direito está na dependência da edição de lei complementar, até
agora inexistente.
Ocorre
que, a própria Constituição Federal, mediante a Emenda
Constitucional nº 20/1998, estabeleceu que, enquanto não for
publicada a lei complementar a que se refere o artigo 201, § 1°,
para aqueles que laboram em atividades sob condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física será aplicado o
disposto nos artigos 57 e 58, da Lei 8.213/1991, na redação vigente
na data de publicação da emenda.
Desse
modo, para os trabalhadores submetidos ao Regime Geral de Previdência
Social, que laboram em condições prejudiciais à saúde e à
integridade física, a aposentadoria especial encontra regramento
provisório que permite o exercício do direito constitucionalmente
assegurado.
Considerando
que o objetivo do legislador constituinte, em ambos os casos foi um
só, isto é, de dar proteção ao direito social à saúde e
efetividade ao princípio da isonomia, além de promover a dignidade
da pessoa humana, tem-se por razoável a aplicação provisória do
mesmo regramento contido nos artigos 57 e 58, da Lei nº 8.213/1991,
aos servidores públicos “cujas atividades sejam exercidas sob
condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física”.
Busca-se,
por conseguinte, mediante mandado de injunção, tornar viável o
exercício, pelos servidores públicos que preenchem os requisitos
para tanto, do direito consagrado no § 4° do artigo 40 da
Constituição, nos termos dos artigos 57 e 58, da Lei nº
8.213/1991.
4.
DO PEDIDO
Ante
o exposto, em favor dos servidores processualmente substituídos que
se encontrem ou se encontrarem na situação fática relatada, o
Impetrante requer:
(a)
a notificação da autoridade impetrada, acima indicada, para que
preste as informações que entender necessárias;
(b) a
intimação do representante do Ministério Público, para que opine;
(c) no
mérito, a concessão da injunção, para, reconhecendo a falta de
norma regulamentadora do direito à aposentadoria especial dos
servidores públicos “cujas atividades sejam exercidas sob
condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física”, remover o obstáculo criado pela omissão legislativa e,
supletivamente, viabilizar o exercício do direito estabelecido no
artigo 40, § 4°, III, da Constituição, nos termos dos artigos 57
e 58, da Lei 8.213, de 1991, até que seja editada a lei complementar
pertinente;
Dá-se à causa, o valor de R$
1.000,00 (mil reais).
N. Termos,
P. Deferimento.
Brasília, 04 de junho de 2008.
Vera Mirna Schmorantz Carlos Alberto M. Cidade
OAB/DF 17.966 OAB/DF 16.800
1
Constituição
da República: “Art. 40 (…) § 4º É vedada a adoção de
requisitos e critérios diferenciados para a concessão de
aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo,
ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos
de servidores: (…) III - cujas atividades sejam
exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física.”
2
Veja-se, por exemplo, os seguintes julgados em controle difuso: “O
direito à contagem especial do tempo de serviço prestado sob
condições insalubres pela servidora pública celetista, à época
em que a legislação então vigente permitia tal benesse,
incorporou-se ao seu patrimônio jurídico. Não obstante, para o
período posterior ao advento da Lei 8.112/90, é necessária a
regulamentação do art. 40, § 4º da Carta Magna. Precedentes.
Recurso extraordinário conhecido e parcialmente provido.” (RE
382.352/SC, Ellen Gracie, Segunda Turma, DJ 06/02/2004); “1.
Servidor público federal: contagem especial de tempo de serviço
prestado enquanto celetista, antes, portanto, de sua transformação
em estatutário: direito adquirido, para todos os efeitos, desde que
comprovado o efetivo exercício de atividade considerada insalubre,
perigosa ou penosa. Com relação ao direito à contagem de tempo
referente ao período posterior à L. 8.112/90, firmou esta Corte
entendimento no sentido de que, para concessão de tal benefício, é
necessária a complementação legislativa de que trata o artigo 40,
§ 4º, da CF. Precedentes. 2. Agravo Regimental provido, em parte,
para, alterando-se a parte dispositiva da decisão agravada, dar
parcial provimento ao extraordinário e reconhecer ao agravado o
direito à contagem especial do tempo de serviço prestado sob
efetivas condições insalubres no período anterior à L.
8.112/90.” (RE 367.314AgR/SC, Sepúlveda Pertence, Primeira Turma,
DJ 14/05/2004).
3
Lei 8.112, de 1990: “Art. 68. Os servidores que trabalhem com
habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com
substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida, fazem jus a
um adicional sobre o vencimento do cargo efetivo.”
4
Quanto às situações e condições ambientais do trabalho que
ensejam a insalubridade, a Lei 8.112, de 1990, remeteu a
regulamentação à “legislação específica”, nos termos do
seu artigo 70 (“Na concessão dos adicionais de atividades
penosas, de insalubridade e de periculosidade, serão observadas as
situações estabelecidas em legislação específica.”) Portanto,
para os servidores públicos são aplicadas as regras da legislação
trabalhista que dizem respeito às condições de trabalho
insalubres, notadamente a Norma Regulamentadora nº 9 – Programas
de Prevenção de Riscos Ambientais e a Norma Regulamentadora nº 15
– Atividades e Operações Insalubres, ambas aprovadas pela
Portaria 3.214, de 8 de junho de 1978, e sucessivas modificações,
do Ministério do Trabalho e Emprego, com suporte no artigo 200 da
Consolidação das Leis do Trabalho.
5
CF:
“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a
guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar,
originariamente: (…) q) o mandado de injunção, quando a
elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Presidente
da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do
Senado Federal, das Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do
Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do
próprio Supremo Tribunal Federal; (…)”
6
Em atenção ao artigo 81, parágrafo único, II, da Lei 8.078, de
1990, está-se diante de um interesse ou direito coletivo quando
“todos
os co-titulares dos direitos mantêm relações jurídicas ou
vínculos jurídicos formais com a parte contrária, ou seja, a
parte contra a qual se dirige a pretensão ou o pedido”
ou em razão “de
uma relação jurídica base que une os sujeitos entre si, de modo a
fazer com que eles integrem grupo, classe ou categoria diferenciada
de pessoas determinadas ou determináveis com interesses
convergentes sobre o mesmo bem indivisível (jurídica ou
faticamente), independente de manterem ou não vínculo jurídico
com a parte contrária”,
conforme leciona Alcides A. Munhoz da Cunha (Evolução das Ações
Coletivas no Brasil. Revista de Processo, n. 77, 1995, p. 229).
Pedro Lenza (Teoria Geral da Ação Civil Pública. São Paulo, RT,
2003, p. 71), explica sobre a indivisibilidade dos bens sobre os
quais convergem os interesses coletivos: “Em
relação aos interesses coletivos, a indivisibilidade dos bens é
percebida no âmbito interno, dentre os membros do grupo, categoria
ou classe de pessoas. Assim, o bem ou interesse coletivo não pode
ser partilhado internamente entre as pessoas ligadas por uma relação
jurídica-base ou por um vínculo jurídico; todavia externamente, o
grupo, categoria ou classe de pessoas, ou seja, o ente coletivo,
poderá partir o bem, exteriorizando o interesse da coletividade.”
7
A possibilidade de proteção coletiva dos direitos e interesses de
parte da categoria representada pela entidade de classe é afirmada
na Súmula 630 do Supremo Tribunal Federal: “A entidade de classe
tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a
pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva
categoria.”
8
Em atenção ao artigo 81, parágrafo único, III, da Lei 8.078, de
1990, está-se diante de direitos individuais homogêneos, quando um
direito eminentemente individual foi erigido à categoria de
interesses metaindividuais meramente para fins de tutela coletiva. A
transindividualidade do direito individual homogêneo é legal ou
artificial. Pode-se dizer “acidentalmente coletivos” os direitos
individuais homogêneos, porquanto os sujeitos são perfeitamente
identificados ou identificáveis e a união entre aqueles
coletivamente tutelados decorrerá de uma situação fática de
origem comum a todos. Pedro Lenza (Teoria Geral da Ação Civil
Pública. São Paulo, RT, 2003, p. 71) entende que os interesses
individuais homogêneos “caracterizam-se
por sua divisibilidade plena, na medida em que, além de serem os
sujeitos determinados, não existe, por regra, qualquer vínculo
jurídico ou relação jurídica-base ligando-os”;
ao passo que Ada Pellegrini Grinover (Código de Defesa do
Consumidor comentado, 7. Ed., Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 813)
posiciona-se em sentido contrário: “Isso
significa, no campo do direito processual, que, antes das
liquidações e execuções individuais (…), o bem jurídico
objeto de tutela ainda é tratado de forma indivisível,
aplicando-se a toda a coletividade, de maneira uniforme, a sentença
de procedência ou improcedência.”
9
Supremo
Tribunal Federal, Primeira Turma, AgReg-RE 197029/SP, Ministro
Ricardo Lewandowski, j. 13/12/2006, DJ 16/02/2007, p. 40: “(…) O
Plenário do Supremo Tribunal Federal deu interpretação ao art.
8º, III, da Constituição e decidiu que os sindicatos têm
legitimidade processual para atuar na defesa de todos e quaisquer
direitos subjetivos individuais e coletivos dos integrantes da
categoria por ele representada.
(…)”
10
STF, MI 20/DF, ministro Celso de Mello, j. 19/05/1994, DJ
22/11/1996. No
mesmo sentido: “(…) Entidades sindicais dispõem de legitimidade
ativa para a impetração do mandado de injunção coletivo, que
constitui instrumento de atuação processual destinado a
viabilizar, em favor dos integrantes das categorias que essas
instituições representam, o exercício de liberdades,
prerrogativas e direitos assegurados pelo ordenamento
constitucional. Precedentes sobre a admissibilidade do mandado de
injunção coletivo: MI 20, Rel. Min. CELSO DE MELLO; MI 342, Rel.
Min. MOREIRA ALVES, e MI 361, Rel. p/ o acórdão Min. SEPÚLVEDA
PERTENCE. (…) (STF, MI 472/DF, ministro Celso de Mello, j.
06/09/1995, DJ 02/03/2001); “(…) A jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal admite legitimidade ativa ad causam aos sindicatos
para a instauração, em favor de seus membros ou associados, do
mandado de injunção coletivo. II. - Precedentes: MMII 20, 73, 342,
361 e 363. (…)” (STF, MI 102/PE, ministro Marco Aurélio, para o
acórdão ministro Carlos Velloso, j. 12/02/1998, DJ 25/10/2002, p.
25); e “1. O acesso de entidades de classe à via do mandado de
injunção coletivo é processualmente admissível, desde que
legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.
(…)” (STF,
MI 689/PB, Rel. Min. EROS GRAU, j. 07/06/2006, DJ 18/08/2006, p.
19).
11
Supremo
Tribunal Federal, RE 193382/SP, Carlos Velloso, j. 28/06/1996,
Tribunal Pleno, DJ 20/09/1996
12
STJ, RESP 547.690/RS, 5ª Turma, Min. Jorge Scartezzini, publicado
em 28/06/2004
13
Humberto Theodoro Junior ensina que: “Em
se tratando de ACP ou de ação coletiva, um mesmo fato lesivo pode
atingir o interesse coletivo e o interesse individual de certos
membros da comunidade. Quando isto se dá, a coisa julgada formada
no processo coletivo não fica restrita às pessoas que ocuparam as
posições de parte na relação processual. Seus efeitos podem
manifestar-se erga
omnes, propiciando
benefícios a terceiros cujos interesses individuais se enquadrem na
hipótese apreciada de forma coletiva. (…) A procedência da ação
coletiva produz, invariavelmente, efeitos erga
omnes.”
(Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, nº 9,
jan/fev 2001, Assunto Especial – Algumas Observações sobre a
Ação Civil Pública e outras Ações Coletivas, p. 156.) Da
mesma forma didática, pronunciou-se, por exemplo, o TRF da 4ª
Região: “Sindicato.
legitimidade ativa. Artigo 8º, II da Constituição. Extensão dos
efeitos de antecipação da tutela a associados não arrolados na
inicial. Possibilidade.
Nas
hipóteses em que o sindicato atua como substituto processual, ele
exerce a representação de toda a categoria, e qualquer decisão
proferida no processo alcançará, necessariamente, todos os seus
associados, estejam eles, ou não, arrolados na inicial.”
(TRF da 4ª Região, AI 97.04.21221-6/PR, 2ª T., Rel. Juíza TÂNIA
ESCOBAR, DJ 02/09/1998.)
14
A redação original do artigo 201 da Constituição não vedava a
adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão
de aposentadoria pelo regime geral de previdência social.
15
Na
redação original a Constituição não vedava a adoção de
critérios e requisitos diferenciados para concessão de
aposentadoria de servidores públicos, no entanto o § 1º do seu
artigo 40 previa o seguinte: “Lei complementar poderá estabelecer
exceções ao disposto no inciso III, ‘a’ e ‘c’, no
caso de exercício de atividades consideradas penosas, insalubres ou
perigosas.”
O inciso III tratava da aposentadoria voluntária do servidor
público e as referidas alíneas tratavam das hipóteses de
aposentadoria com proventos integrais e proporcionais.
16
As
discussões em torno revogação tácita ou não do § 5° do artigo
57 da Lei 8.213, de 1991, não obsta o julgamento de procedência
deste mandado de injunção, sendo que, na hipótese de ser o
dispositivo da Lei 8.213 adotado como norma adequada à regulação
que se busca, até a edição da lei complementar pertinente, a
revogação ou não do parágrafo em comento estará sujeita à
interpretação pelo aplicador, conforme observado pelo Min. Eros
Grau, no julgamento do MI 721 (“À este Tribunal incumbirá –
permito-me repetir – se concedida a injunção, remover o
obstáculo decorrente da omissão, definindo a norma adequada à
regulação do caso concreto, norma enunciada como texto normativo,
logo sujeito a interpretação pelo seu aplicador”). Sobre a
ausência de revogação tácita da disposição, veja-se a Apelação
Cível 1221609, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região e a
Apelação Cível 200204010248301, do Tribunal Regional Federal da
4ª Região.
17
Na
espécie, a impetrante, auxiliar de enfermagem, pleiteava fosse
suprida a falta da norma regulamentadora a que se refere o art. 40,
§ 4º, a fim de possibilitar o exercício do seu direito à
aposentadoria especial, haja vista ter trabalhado por mais de 25
anos em atividade considerada insalubre.
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