quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Notas de aula: Coisa Julgada






COISA JULGADA




Coisa julgada formal é a preclusão da decisão. A decisão não pode mais ser revista no processo em que proferida. Do ponto de vista tradicional, a doutrina não distingue coisa julgada formal da preclusão (são sinônimos).

Coisa julgada material é a indiscutibilidade da decisão em qualquer processo, não só naquele que foi proferida, mas em qualquer processo. Há uma eficácia externa.
A concepção mais recente, defendida por Fredie Didier Jr. e Luis Mourão, entre outros, distingue preclusão da coisa julgada formal e material. A preclusão é a indiscutibilidade da decisão no processo em que foi proferida. A coisa julgada, por sua vez, sempre tem uma força externa, sempre tornando indiscutível a decisão em outro processo. A coisa julgada formal, nesse sentido, seria a indiscutibilidade das decisões com conteúdo processual, ela seria indiscutível naquele processo e em qualquer outro (ex: decisões que extinguem o processo por conta de vício processual não permitem a propositura de demanda idêntica sem a correção do vício processual). Já a coisa julgada material diz respeito a indiscutibilidade, em qualquer processo, das questões relativas ao mérito da causa.

Pressupostos da coisa julgada (o que precisa acontecer para que haja a coisa julgada material).
A decisão deve ser de mérito (resolução de mérito);

A decisão deve ser fundada em cognição exauriente (definitiva, juízo de "certeza");
Efeitos da coisa julgada

Efeito negativo ou impeditivo da coisa julgada: a coisa julgada impede nova decisão sobre aquilo que foi decidido.

Efeito positivo da coisa julgada: as vezes você vai ao Judiciário com uma demanda fundada justamente na coisa julgada (ex: vitorioso em ação de investigação de paternidade posteriormente ingressa com ação de alimentos fundada na sentença judicial transitada em julgado reconhecendo a paternidade). Quando isso acontece, a coisa julgada gera o efeito positivo, pois o juiz da segunda demanda está obrigado a levar a coisa julgada da primeira demanda em consideração. No exemplo citado, o juiz vai ter que julgar o pedido de alimentos com base na coisa julgada anterior. Ele até poderá dizer que o autor não tem direito a alimentos, mas não poderá dizer que o autor não é filho do réu, pois esse fundamento tem de ser observado.

Efeito preclusivo da coisa julgada (eficácia preclusiva da coisa julgada): art. 474 do CPC: a coisa julgada faz com que tudo aquilo que poderia ter sido deduzido para o acolhimento ou rejeição do pedido se repute deduzido e rejeitado. O que era deduzível e não foi deduzido reputa-se deduzido e repelido.

Importante: a eficácia preclusiva da coisa julgada não impede que você formule novamente o pedido com base em outra causa de pedir. Tudo o que acontece depois da coisa julgada não diz respeito a eficácia preclusiva (fatos supervenientes. Ex: pagamento após a coisa julgada). Sempre que a sentença disser respeito a uma relação jurídica continuativa (ex: relação de família, relação tributária, relação de alimentos), fatos posteriores a essa decisão podem afetar a coisa julgada.

Limites subjetivos da coisa julgada (quem se submete a coisa julgada)

Coisa julgada inter partes: é a regra geral coisa julgada afeta somente as partes do processo (art. 472 do CPC).

Coisa julgada ultra partes: a coisa julgada vincula quem não é parte, atingindo terceiros (ex: coisa julgada advinda de processo conduzido por um substituto processual, atingindo o substituído. Ex2: coisa julgada que vincula o adquirente de coisa litigiosa – art. 42, § 3º, CPC).

Coisa julgada erga omnes: é a coisa julgada que vincula a todos. É o que acontece nas ações coletivas, na ADIN, na ADC, ADPF.

Modos de produção da coisa julgada

Coisa julgada pro et contra: para a coisa julgada, pouco importa o resultado do processo. Qualquer que seja o resultado do processo, haverá coisa julgada. É a regra geral.

Coisa julgada secundum eventum litis: é aquela coisa julgada que só se produz quando houver um determinado resultado escolhido pelo legislador. No processo civil, esse regime ofenderia a igualdade, pois uma das partes não teria coisa julgada1. No processo penal, entretanto, só há coisa julgada na sentença absolutória, já que a sentença condenatória penal pode ser revista a qualquer tempo (revisão criminal).

Coisa julgada secundum eventum probationis: a coisa julgada só se produzirá se houver esgotamento da prova. Se a improcedência for por falta de prova, não haverá coisa julgada (ex: mandado de segurança, ações coletivas, ação popular).

Limites objetivos da coisa julgada
O que se torna indiscutível na decisão é o conteúdo do dispositivo da decisão. É esse comando normativo individualizado que se torna indiscutível. Sobre a fundamentação não recai coisa julgada, mas pode recair a eficácia do precedente.

Controle da coisa julgada
A coisa julgada pode ser controlada (revista). Ela não é, em nosso ordenamento, inexpugnável. Existem instrumentos de controle da coisa julgada para evitar a perpetuação de iniquidades.

Instrumentos de controle: ação rescisória (prazo de 2 anos para entrar com a ação), permitindo ampla revisão, ora por critérios de justiça, ora por critérios de validade; querela nullitatis (não tem prazo e permite a revisão da coisa julgada por questão formal relacionada a citação); correção de erro material (mediante simples petição, a qualquer tempo); revisão de decisão fundada em lei, ato normativo ou interpretação tidos pelo STF como inconstitucionais (art. 475-L, § 1º, CPC e 741, parágrafo único, CPC).

Relativização da coisa julgada
Uma corrente doutrinária que prega a possibilidade de relativizar a coisa julgada de modo atípico, ou seja, em hipóteses não previstas nos 4 instrumentos típicos de controle. Esse movimento influenciou bastante a jurisprudência, havendo decisões do STJ relativizando a coisa julgada fora das hipóteses legais. O STF já relativizou a coisa julgada em caso de investigação de paternidade e exame de DNA (RE n. 363889). Atualmente, ele está enfraquecido, pois a doutrina acabou se posicionando contra essa tese (ex: Barbosa Moreira, Luis Guilherme Marinoni, Ovídio Batista, Nelson Nery).

Efeito suspensivo do recurso
Efeito suspensivo do recurso é o efeito que o recurso tem de prolongar a ineficácia da decisão recorrida. Todo recurso pode ter efeito suspensivo. Há recursos que tem efeito suspensivo automático (efeito suspensivo ope legis). Há recursos que podem ter efeito suspensivo por determinação judicial (caberá o órgão judicial atribuir o efeito suspensivo caso a caso), tratando-se de efeito suspensivo ope judicis (ex: agravo de instrumento).

Efeito devolutivo do recurso
O efeito devolutivo tem uma dupla dimensão: existe a dimensão horizontal, também chamada de extensão do efeito devolutivo e a dimensão vertical do efeito devolutivo, também chamada de profundidade do efeito devolutivo (alguns autores chamam de efeito translativo – Ex: Nelson Nery).

A dimensão horizontal (extensão) do efeito devolutivo: o recurso devolve ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. Aquilo que se impugnou é devolvido para ser decidido. O recurso delimita a área, a extensão do que o tribunal poderá decidir. Esse objeto é delimitado pelo recorrente. É ele quem vai dizer o que o tribunal terá de re-decidir. Se o tribunal decidir além do que foi pedido, incorre em sentença extra petita, sendo inválida. Por isso que se diz que a extensão do efeito devolutivo segue o princípio dispositivo.

A dimensão vertical (profundidade) do efeito devolutivo: o recurso devolve ao tribunal a análise das questões indispensáveis a solução daquilo que foi impugnado. As questões que o tribunal precisa analisar para decidir o que foi impugnado são devolvidas pela profundidade do efeito devolutivo.



Em construção


1Cuidado para não confundir: no caso da coisa julgada nas ações coletivas, apenas a sua extensão para o plano individual que é secundum eventum litis. A coisa julgada, em si, existirá sempre.

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