CONTESTAÇÃO
Contestação
é a defesa clássica do réu contra o autor da demanda. Ela tem
natureza residual. Somente podemos considerar "contestação"
materiais de defesa não abrangida pelas exceções (de impedimento,
de suspeição, de competência relativa, etc).
Princípio
da eventualidade (princípio da concentração):
toda matéria de contestação deve ser alegada na defesa, sobre pena
de preclusão. O processo não é um jogo de cartas na mão onde
escolhe-se quando serão utilizadas. O "jogo" é com cartas
na mesa e todas elas devem ser utilizadas de uma só vez, na
contestação. “Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a
matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que
impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende
produzir” (art. 336 do novo
CPC).
* A
regra incide mesmo que as alegações oferecidas na contestação
sejam incompatíveis entre si. É a posição majoritária.
Vide lição de Daniel Assumpção Neves:
"A
exigência de cumulação de todas as matérias de defesa na
contestação faz com que o réu se veja obrigado a cumular defesas
logicamente incompatíveis, por exemplo, no caso de alegar que não
houve o dano alegado pelo autor mas que, na eventualidade do juiz
entender que houve dano, não foi no valor apontado pelo autor,
circunstância verificada com regularidade nos pedidos de condenação
por dano moral. Certa incompatibilidade lógica é natural e
admissível, mas o réu jamais poderá cumular matérias defensivas
criando para cada uma delas diferentes situações fáticas, porque
com isso em alguma das teses defensivas estará alterando a verdade
dos fatos. Pode-se afirmar que o limite do princípio da concentração
da defesa é o respeito ao princípio da boa-fé e lealdade
processual (Manual de Direito Processual Civil, volume único, 5ª
edição, ed. Saraiva, p. 359-360).
Na
mesma linha, Fredie Didier Jr.:
"A
regra da eventualidade autoriza, então, que o réu deduza defesas
logicamente incompatíveis. Mas o princípio da boa-fé processual
impõe que essa cumulação de defesas incompatíveis tenha limites.
Nem toda ilogicidade é superada pela aplicação da regra de
concentração da defesa" (Curso de Direito Processual Civil,
17ª edição, Ed. Juspodvim, p. 639)
A
posição minoritária de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio
Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero no sentido de que não é possível
alegar teses incompatíveis entre si, exigindo-se coerência lógica:
"A
regra da eventualidade revela ainda outro tema de relevo, que diz
respeito à coerência da defesa. Desse modo, não obstante seja
exigível a apresentação de toda matéria de defesa na contestação,
há de guardar ela, em seu conjunto, certa homogeneidade e
compatibilidade. Assim, certamente, não terá condição o réu de
sustentar, em sua defesa, a inexistência da dívida e seu
pagamento., já que uma certamente exclui, por questão de lógica, a
viabilidade da outra. É lógica - e os deveres da boa-fé e de
veracidade que todos os participantes do processo têm no processo
civil (art. 5º) - que determinará quais as defesas que, dentro de
um padrão nracional, podem ser utilizadas e quais devem ser
descartadas, não compondo o contexto da defesa do réu." (Novo
Curso de Processo Civil, 1ª ed., Ed. RT, p. 180)
As
exceções a regra do princípio da eventualidade
(CPC/1973, art. 303 e novo CPC
art. 342):
-
Matérias que o juiz pode conhecer de ofício (ex:
decadência legal art. 210 CC, cláusulas abusivas em contrato de
consumo art. 51 CDC);
-
Relativas a direito superveniente;
-
Expressa autorização legal para serem alegadas a qualquer
tempo e grau de jurisdição;
-
Fato superveniente constitutivo, modificativo ou extintivo do
direito
(art.
462 do CPC/1973 e art. 493 novo
CPC);
O
prazo para oferecer
contestação é, de regra, de 15 dias, começando (art.
335 novo CPC):
-
Da data da audiência de conciliação ou mediação ou da
última sessão de conciliação, se uma das partes não comparecer
ou não houver acordo;
-
Do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de
conciliação/mediação apresentado pelo réu (se autor e
réu manifestaram desinteresse na audiência);
Nos
demais casos, na forma do art. 231 do novo
CPC:
-
Da data de juntada aos autos do AR cumprido (citação pelo correio)
ou mandado cumprido (oficial de justiça);
-
Da data da ocorrência da citação via escrivão/chefe de
secretaria
-
Do dia útil seguinte a dilação de prazo dada pelo juiz, se a
citação for por edital;
-
Do dia útil seguinte à consulta ao teor da citação ou
término do prazo para a consulta, quando for na forma eletrônica;
-
Da data da juntada do comunicado ou carta devidamente cumprida,
quando a citação se der por meio de carta (precatória/rogatória);
-
Da data da publicação no Diário da Justiça impresso ou
eletrônico;
-
Do dia da carga dos autos, quando a se der por meio da retirada
dos autos, do cartório/secretaria;
No
CPC/1973, o Ministério Público e Fazenda Pública tem prazo em
quádruplo para contestar (art. 188 do CPC/1973). A Defensoria
Pública tem prazo em dobro para contestar (art. 5º, § 5º, Lei n.
1.060/50 e art. 44, I, LC n. 80/94).
No
novo CPC, a
Defensoria Pública, Fazenda Pública e Ministério Público terão
prazo em dobro para todas as suas manifestações, contados da
intimação pessoal (arts. 180, 183, e 186), salvo se a lei
estabelecer, de forma expressa, prazo próprio para essas
instituições (arts. 180, § 2º, 183, § 2º e 186, § 4º)
No
novo CPC, o prazo em
dobro para a Defensoria Pública aplica-se aos escritórios de
prática jurídica das faculdades de Direito reconhecidas na forma da
lei e às entidades que prestam assistência jurídica gratuita em
razão de convênios firmados com a Defensoria Pública. (186, §
3º).
A
contestação normalmente é apresentada diante do juiz da causa. Mas
o novo
CPC permite, se
for alegada a incompetência relativa ou absoluta, que o réu
protocole a contestação em foro de seu domicílio, fato que será
imediatamente comunicado ao juiz da causa, preferencialmente por meio
eletrônico (art. 340).Trata-se
de inovação em relação ao CPC anterior. Essa alegação
suspende a audiência de conciliação/mediação, se tiver sido
designada. Definida a competência, o juízo competente designará
nova data para a audiência, se for o caso.
Contestação
é uma defesa estática. Quando o réu contesta, ele apenas resiste
ao pedido do autor.
Defesas
processuais são aquelas que tratam de pressupostos processuais e
requisitos necessários para a prestação da tutela jurisdicional
(ex: incompetência, litispendência, ilegitimidade, falta de
interesse processual).
Defesas
materiais são as que discutem o mérito da causa. Defesas
materiais diretas são aquelas em que o réu simplesmente nega
o fato constitutivo do direito do autor ou a consequência jurídica
do fato por ele alegado (ex: em uma ação de despejo, o réu alega
que não existe contrato de locação ou que o contrato é de
comodato do imóvel). Defesas materiais indiretas são aquelas
em que o réu não nega a ocorrência do fato constitutivo do direito
do autor, mas alega a ocorrência de fatos impeditivos (não paguei a
dívida porque o serviço não foi prestado), modificativos (ex: a
dívida foi parcelada) ou extintivos (a dívida foi paga) do direito
do autor.
Essa
distinção não é meramente acadêmica. Note-se que se a defesa de
mérito é direta, não alega-se nenhum fato novo, apenas é negado o
fato alegado pelo autor. Já na defesa de mérito indireta, um fato
novo é alegado (um fato que obsta a pretensão do autor). É por
essa razão que, havendo defesa de mérito indireta, o juiz deve dar
vista ao autor para o oferecimento de réplica (providência
preliminar, art. 350 do novo
CPC), como corolário lógico do direito constitucional ao
contraditório (art. 5º, LV, CF e art. 8º, novo
CPC).
Antes
do réu oferecer teses relativas ao mérito da demanda, cumpre o
oferecimento das teses processuais denominadas questões
preliminares. São teses que, se acolhidas, impedem o exame das
questões posteriores, incluindo o mérito (salvo se for possível
julgar o mérito a favor de quem a extinção do processo sem
julgamento do mérito aproveitaria).
São
questões que devem ser conhecidas de ofício pelo juiz (art. 337, §
5º, novo CPC), salvo
a convenção de arbitragem (art. 337, § 6º) e a incompetência
relativa (não alegada na contestação, a competência prorroga-se,
art. 65).
As
matérias processuais a serem oferecidas na contestação devem
obedecer a seguinte ordem (art. 337 do novo
CPC) de questões preliminares:
I
- inexistência ou nulidade de citação;
II
- incompetência absoluta ou relativa;(*o
novo CPC suprimiu a chamada exceção de incompetência.
A incompetência relativa, agora, deve ser alegada no bojo da
contestação).
III
- incorreção no valor da causa; (*o
novo CPC inova e traz a impugnação ao valor da causa
para dentro da contestação, abolindo-a, como exceção em apartado.
A não alegação leva a preclusão).
IV
- inépcia da petição inicial; (* O silêncio do
réu pode acarretar preclusão, entendendo o juiz que o réu
conseguiu se defender, mesmo havendo obscuridade na petição
inicial).
V
- perempção; (art. 486, § 3º, do novo CPC: Se o autor der causa, por 3 (três) vezes, a sentença fundada em abandono da causa, não poderá propor nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa o seu direito).
VI
- litispendência; (* Como o anterior, o
novo CPC adota a teoria da tríplice identidade: para
haver litispendência, devem haver causas com mesmas partes, mesmo
pedido e mesma causa de pedir, art. 337, §§ 1º a 4º)
VII
- coisa julgada ; (vide inciso anterior)
VIII
– conexão; (* dispositivo aplicável por analogia
também à continência).
IX
- incapacidade da parte;
X
- convenção de arbitragem; (*a ausência de
alegação de convenção de arbitragem implica na aceitação da
jurisdição estatal e renúncia ao juízo arbitral. A existência de
qualquer espécie de convenção arbitral - cláusula compromissória
ou compromisso arbitral - não pode ser conhecida de ofício pelo
juiz).
XI
- ausência de legitimidade ou interesse processual;
(*no novo CPC,
o réu que alega ilegitimidade passiva deve indicar quem é o
legitimado, salvo a impossibilidade por desconhecimento. Não o
fazendo, indenizará o autor pelos prejuízos com a falta de
indicação (arts. 338 e 339). Indicado o legitimado, o juiz dará
vista ao autor para em 15 dias dizer se deseja retificar ou inclui-lo
como litisconsorte passivo (art. 339, §§ 1º e 2º). Caso haja
retificação, o autor indenizará o réu primário pelas despesas
processuais em que incorreu. (art. 338, parágrafo único e 339, §
1º). Aplica-se a qualquer procedimento, mesmo os especiais.
XII
- falta de caução ou de outra prestação que a lei exige
como preliminar; (ex: não pagamento de honorários
advocatícios em processo extinto sem resolução de mérito, quando
o autor intente a mesma ação - art. 486, § 2º, novo
CPC, não pagamento das custas processuais - art. 290
do novo CPC,
não realização de depósito obrigatório na ação rescisória -
art. 968, II, do novo CPC,
não apresentação da caução pro expensis - art. 83 do novo
CPC)
XIII
- indevida concessão do benefício da gratuidade de justiça.
(* O novo CPC
inovou, retirando essa impugnação de petição em apartado e
trazendo-a para o bojo da contestação).
Porém,
é importante saber que a ordem estabelecida pelo legislador para o
oferecimento das teses na contestação não implica em ordem de
preferência de questões processuais em detrimento do mérito da
causa. O art. 488 do novo
CPC afirma que "Desde que possível, o juiz
resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a
quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485."
(extinção do feito sem resolução de mérito).
Não
basta alegar toda matéria de defesa. É preciso se defender
especificamente sobre tudo o que foi alegado pelo autor.
Ônus
da impugnação específica: incumbe ao réu manifestar-se
precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição
inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas. (art. 341 do
novo CPC).
É
a exigência de que o réu se defenda pormenorizadamente dos fatos
trazidos pelo autor. O réu não pode-se defender genericamente,
alegando "o autor não tem razão e ponto." Compete ao réu
apresentar os fatos modificativos ou extintivos do direito alegado
pelo autor.
Exceção
a regra do ônus da impugnação especificada dos fatos (art.
341, I, II, III e parágrafo único, do novo CPC):
-
Se não for admitida a confissão (direito indisponível);
-
Se a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a
lei considerar da substância do ato;
-
estiverem os fatos em contradição com a defesa, considerada em seu
conjunto;
-
Tratar-se de manifestação de defensor público, advogado dativo e
curador especial; (é a chamada Defesa por negativa geral: é o
antônimo da impugnação específica. É desnecessária a impugnação
específica dos fatos. Pelo art. 302, parágrafo único do CPC/1973,
o ônus da impugnação especificada dos fatos não se aplica ao
Ministério Público, ao defensor público, ao advogado dativo e ao
curador especial. No novo
CPC a regra é repetida, suprimindo-se, porém, o
Ministério Público (art. 340, parágrafo único).
Pedido
do réu
É
comum dizer que “o réu nada pede. Impede”. Isso significa
que a contestação não interfere no objeto da demanda (salvo a
realização de pedido contraposto). Mas, do ponto de vista técnico,
o réu poderá requerer, em sua defesa:
-
A extinção do processo sem exame do mérito;
-
A remessa dos autos ao juízo competente;
-
A devolução do prazo para defesa;
-
A improcedência do pedido do autor;
-
A condenação do autor aos ônus da sucumbência;
-
A condenação do autor por litigância de má-fé
-
A pretensão dúplice em caso de ações dúplice (ex: ações
meramente declaratórias).
Aditamento
a contestação: é possível, desde que seja para oferecimento
das defesas que podem ser oferecidas após a contestação (previstas
no art. 342 do novo CPC,
já examinadas). Claro que nessa hipótese, deverá ser dada a
oportunidade a parte autora para se manifestar sobre o aditamento, em
razão da garantia constitucional do contraditório (art. 5º, LV,
CF).
A
contestação apresentada fora do prazo é tida por
intempestiva e, portanto, indeferida. Porém, se nela houver
alegações que podem ser conhecidas mesmo após o prazo para
contestar, não poderá ser desentranhada dos autos (art. 342 do novo
CPC) e os documentos que nela se contém devem permanecer
nos autos, já que o réu tem direito de produção de provas (art.
349 do novo CPC e
Súmula n. 231 do STF: “o revel, em processo cível, pode produzir
provas desde que compareça em tempo oportuno”).
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